Foi noticiado, no defeso, que Xavi Hernandez abandonaria o clube de sempre. O motivo era o mais trivial de todos, o de que a idade avançava e as qualidades de Xavi já não eram as de outros tempos. A sustentar esta tese estavam, como sempre, os números. A época anterior, não obstante a titularidade indiscutível, fora surpreendentemente fraca, quer em golos, quer em assistências. Como sabe quem lê este blogue, creio que os números são o pior dos argumentos, em futebol. E podem mesmo ser falaciosos, como me parece ser o caso. O Barcelona de Tata Martino, sobretudo o da segunda metade da época, era uma equipa pouco dinâmica, pouco capaz de envolver os médios em acções ofensivas. É natural que Xavi, um jogador cujos números sempre dependeram do facto de o colectivo jogar de uma determinada maneira, se ressentisse, nesse aspecto. Pessoalmente, acho que o futebol do médio espanhol ainda não começou a decair, e que Xavi ainda é capaz de tudo aquilo que o distinguiu. As suas capacidades físicas podem já não ser as que foram (o que não é sequer certo), mas Xavi nunca se distinguiu por elas. Sempre foi um jogador de poucos rasgos, de poucas mudanças de velocidade, um jogador de regularidade, que faz das decisões a sua principal arma. E isso - perdoem-me os que acham que depois dos 30 anos um jogador já não é o que era - é coisa que Xavi ainda não perdeu. Aos 34 anos, continua ser o mesmo jogador cerebral que era, o mesmo jogador capaz de gerir os ritmos da equipa, capaz de jogar por fora e por dentro do bloco adversário, capaz de perceber, a cada momento, o que é melhor para a sua equipa. Há jogadores que se destacam por qualidades atléticas que, com 34 anos, dificilmente poderão ser o que eram aos 30. Com Xavi não é assim. Com Xavi - diria mesmo - ter 30 anos ou ter 38 é mais ou menos o mesmo. E desconfio que só deixa de jogar ou por preconceito do seu treinador ou quando decidir que é tempo de parar.
Contra o Eibar, na jornada passada, foi assim. Aquele lance em que tira um adversário do caminho e depois trava, ajeitando de calcanhar, com dois toques, tirando mais um adversário da frente, foi já perto do final do jogo. Alguém que, com 34 anos, faz 90 minutos e ainda tem a frescura, física e mental, para fazer uma coisa daquelas é alguém que não está acabado, como dizem. Há um preconceito muito comum no futebol moderno que consiste em presumir que um jogador que já não tem as pernas que tinha tem de dar lugar a quem as tenha. O preconceito está em considerar o futebol um jogo em que "ter pernas" é o principal requisito de quem o joga. Não só isso é falso como há jogadores que nunca se caracterizaram por "ter pernas". Há uns anos, Allegri achou que Pirlo estava velho. Dispensou-o, e ele foi ser campeão pela Juventus. Com Xavi, é mais ou menos o mesmo. Associou-se a época menos feliz do Barcelona, no ano transacto, à idade de Xavi, e fez-se crer que o maestro do meio-campo catalão tinha de dar lugar a outros. É sempre mais fácil achar que uma equipa precisa de mudar de intérpretes do que achar que precisa de mudar de interpretação. Com Luís Enrique, Xavi parece ter perdido o estatuto de titular indiscutível. Mas, no Barcelona de Luis Enrique, cuja principal virtude, em relação ao Barça de Tata Martino, é ser capaz de pressionar mais alto, e com o bloco bem mais junto, Xavi volta a ter o protagonismo que tinha antigamente. Volta a ter muita bola, em zonas avançadas do terreno, com companheiros perto de si, e volta a poder fazer o que melhor sabe. Quem vê Xavi a jogar hoje, não consegue ver grandes diferenças para o que era Xavi há 5 ou 6 anos. A idade está lá, e sempre que o Barcelona não for a equipa de posse que foi com Guardiola, uma equipa paciente, sem pressas, que joga a maior parte do tempo no meio-campo do adversário, que pressiona alto, começando as suas jogadas em terrenos muito avançados, Xavi terá as dificuldades que sempre teve. Mas se o colectivo lhe permitir potenciar as suas melhores qualidades e o proteger das debilidades que sempre teve, será o mesmo Xavi que era. Quem joga, numa equipa desse tipo, é o cérebro. E um cérebro de 34 anos está tudo menos acabado.
5 comentários:
Xavi é, de facto, indubitavelmente um jogador de características ofensivas distintas, marcantes. Como poucos no mundo. Mas só o é, se o treinador lhe fizer a papinha toda. Com a movimentação dos colegas, com as variadas opções de passe em apoio e em profundidade, com a proximidade de jogadores. Mas, sem bola "morreu". Ou seja, é verdade que tudo o que ele dá com bola é compensado com o seu futebol ofensivo, e com uma forte reacção à perda onde a equipa (ele) precise de correr poucos metros. Mas se a pressão for batida e ele tiver de recuperar muitos metros, já não o faz com a ferocidade anterior. Não sei se o problema é mental, no sentido de o/s treinador/es não o ter/em convencido da sua ideia de jogo, e como tal ele estar desconfiado que vai fazer esse tipo de sprints de longa distância N vezes por jogo, acabando morto aos 30 minutos. Mas poderá, também, ser do conhecimento do seu próprio estado e limitações actuais. Antes, Xavi pouco descansava. Apesar da equipa ter sempre bola, ele estava constantemente a servir como linha de passe. Claro que o ritmo a que ele se movimenta quando a equipa tem a bola é inferior. Daí o descansar com bola, para numa situação pontual recuperar muitos metros. Mas hoje, noto nele, uma maior necessidade de descanso, sobretudo quando as primeiras linhas de pressão são batidas.
Apesar de tudo isso, eu "ainda acredito em Xavi". Como disse a uns amigos poucos dias antes deste jogo. Porque o que ele dá com bola, a uma equipa que queira e saiba ter bola, que queira saiba preparar o momento da perda, é impagável. Qualidade que nunca mais acaba. Até parado!
Pois, parece que discordamos. Em primeiro lugar, um treinador que não faz a "papinha" aos seus jogadores não me parece que seja um treinador. É essa a função dele, fazer com que as fragilidades individuais sejam atenuadas pelo colectivo. Quanto àquilo que dizes do Xavi sem bola, nem sequer percebo. Primeiro porque, "sem bola" quer dizer duas coisas: 1) o que o jogador faz quando não tem a bola, mas a sua equipa a tem; 2) o que o jogador faz quando a equipa não tem a bola. Quanto ao primeiro caso, Xavi é inquestionavelmente dos melhores. Basta ver a quantidade de movimentos que faz para solicitar o passe, as linhas de passe que oferece, as linhas de passe que arranja para os colegas, por exemplo, "escondendo-se" entre linhas para permitir uma lateralização, etc.. Quanto à segunda, que me parece o principal ponto que fazes, sinceramente não vejo diferença alguma para o que Xavi foi no passado. Ele nunca foi um jogador forte quando obrigado a recuperar muitos metros. E nunca foi preciso que o fosse, porque a equipa estava constantemente curta e só havia uma forma de bater a primeira linha de pressão, que era jogar nas costas da defesa. Os médios do Barça de Guardiola, por exemplo, nunca precisaram de fazer piscinas. Por fim, o descanso. Eu não sei bem ao que te referes. O ano passado o Xavi continuava a ser o jogador que mais quilómetros corria na equipa, como foi praticamente sempre. E isso liga-se ao número de passes que realiza durante o jogo, muito acima dos seus companheiros. É o jogador por quem a bola mais vezes passa porque é o jogador que mais corre e faz por tê-la. Daí não perceber bem a diferença que estás a assinalar entre o Xavi actual e o Xavi de antes. Para mim, são o mesmo, tirando o preconceito que se criou nos últimos 2 anos por força sobretudo dos golos e das assistências da época passada e da idade que ele tem agora.
"Quanto ao primeiro caso, Xavi é inquestionavelmente dos melhores. Basta ver a quantidade de movimentos que faz para solicitar o passe, as linhas de passe que oferece, as linhas de passe que arranja para os colegas, por exemplo, "escondendo-se" entre linhas para permitir uma lateralização, etc.. "
De acordo e acrescento as linhas de passe de profundidade que ele também dá.
" Quanto à segunda, que me parece o principal ponto que fazes, sinceramente não vejo diferença alguma para o que Xavi foi no passado. Ele nunca foi um jogador forte quando obrigado a recuperar muitos metros."
Eu não disse que ele era forte. Disse que recuperava. E se quiseres acrescento recuperava como podia. Pá, o Barcelona que não de Guardiola foi obrigado muitas vezes (por força do adversário ou da pouca qualidade que foi apresentando) a defender no seu meio campo defensivo. Com quase todas as linhas presentes (extremos/médios/defesas), e nesses momentos Xavi participava. Como podia, recuperava, baixava e chegava a estar na maior parte dos lances. O que me parece que agora acontece (dos últimos jogos que vi dele) é que ele já nem recupera...
"O ano passado o Xavi continuava a ser o jogador que mais quilómetros corria na equipa, como foi praticamente sempre."
Porque está constantemente a dar linhas de passe, como disse.
Só que com bola é ele (a equipa dele) que define o ritmo a que se movimenta. Portanto pode gerir os tempos e o descanso como quer. Pode até jogar 4 horas seguidas em posse sem problemas. Mas sem bola (na posse do adversário) o adversário é que define o ritmo a que ele (equipa dele) se deve ajustar/adaptar. E aí, ele pouco tem para descansar. E é aí, nesse ponto, que ele me parece francamente pior. Ainda assim, e repito, numa equipa minha, seria sempre ele e mais 10. Porque o que ele oferece com bola (quando a equipa dele a tem) tem um valor inestimável. A minha questão, como vês não se prende com Xavi, mas sim com aquilo que o treinador exige da equipa (para a posição dele), bem como com aquilo que a equipa dele permite aos adversários...
Portanto, para mim, está um pouco pior. Porque não recupera de todo. Mas ainda assim, continuava a valer.
Concordo a 100% com o Nuno. Aliás quando o Rui Costa voltou ao Benfica também não percebi as criticas do ser "velho", porque o Maestro nunca se notabilizou por ser um portento físico. Tinha outras qualidades, que não eram afectadas pela idade (antes pelo contrário).
Em relação ao argumetno do Roberto Baggio: "o Barcelona que não de Guardiola foi obrigado muitas vezes (por força do adversário ou da pouca qualidade que foi apresentando) a defender no seu meio campo defensivo" tenho as minhas dúvidas. Antes de Guardiola, com Rijkaard, já o Barça jogava sobretudo em posse, mesmo que sem as % pornográficas do Pep Team. Não me lembro de ver o Barça ser submetido por nenhuma equipa, nos anos de Deco, Ronaldinho e companhia. Na era pré-Rijkaard, Xavi jogava 20 metros mais atrás, portanto aí sim aparecia em zonas mais recuadas, mas porque era a sua posição, não porque tivesse em melhores condições fisicas para tarefas defensivas.
Sinceramente, também não me deixo levar por números, embora não os descure, porque querem sempre dizer algo.
Na época anterior deu-me a sensação da quebra qualitativa do futebol do Xavi, e esta época, após ver o Real Madrid-Barcelona, fiquei ainda mais convicto que Xavi não é o mesmo jogador da era Guardiola. Não só ele como Iniesta, penso que os dois estão muito aquém do que já fizeram. E isso, como adepto dp Barcelona, deixa-me apreensivo e temeroso... gostava que o Barcelona voltasse ao topo da Europa (voltar a vencer uma liga dos campeões).
Enviar um comentário