segunda-feira, 27 de abril de 2009

Coisas que se passaram

1. A agressão de Pepe foi a notícia da semana. Em poucas palavras, 10 jogos para alguém que não tem antecedentes parece-me um castigo pesado, ainda que a paragem cerebral de Pepe tenha tido consequências pouco desculpáveis. No entanto, o que é importante tentar perceber são os motivos que levaram àquilo. Há quem diga que Casquero, o agredido, terá dito alguma coisa a Pepe, pois só assim se justificaria tal coisa. Mas se isso fosse verdade, não teria o internacional português mencionado o facto, em sua defesa? Para mim, Pepe perdeu a cabeça por frustração. Tivera responsabilidades directas nos dois primeiros golos do Getafe e, a três minutos do fim, cometia um penalty que daria boas hipóteses de derrota ao Real. Ao contrário da posição de Luis Sobral, que opta por não tentar explicar o que não sabe, a reacção de Pepe - parece-me - é apenas consequência da frustração de mais um mau jogo. E consequência também do jogador que é: irreflectido, imponderado, incapaz de conter os ímpetos. Foi a cereja no topo do bolo de uma época absolutamente desastrosa, época esse que o Entre Dez lembrará em breve e que coloca Pepe no seu devido lugar, bem longe dos melhores centrais europeus da actualidade.

2. Por cá, lesionou-se Lucho González e depois Hulk. Na minha óptica, a Providência fez troça do Sporting, como quem dá um chupa-chupa a uma criança e depois o tira quando esta está pronta a pô-la na boca. Se a lesão de Lucho deixou antever um final de época atribulado para o conjunto nortenho, estando o Sporting à espreita de uma escorregadela dos campeões nacionais, já a de Hulk veio permitir que a equipa não jogue manca. Assim, mesmo sem o jogador mais criativo da equipa (como é óbvio, não estou a falar do Hulk), o Porto continuará coeso, a jogar como equipa, com jogadores adultos como Mariano e Farias, e continua o mais sério candidato ao título.

3. Entretanto, Lisandro resolveu com classe e Fernando já é comparado a Paulo Assunção. O Entre Dez, como é hábito, resolveu antecipar-se às modas e disse, há coisa de seis ou sete meses, basicamente o mesmo. Não podem ouvir nada...

4. O Sporting, sem nenhum dos habituais titulares do meio-campo, rubricou uma exibição como há muito não se via. Pereirinha, o tal que não tinha talento, agora já tem muito potencial. Romagnoli joga demasiado para a equipa e no futebol, como todos sabemos, pensar primeiro no colectivo e depois em si não leva a lado nenhum. Postiga é outro que é fraquinho... Que paciência para isto. O Sporting, jogando desde o início da época com Patrício, Abel, Grimi, Carriço, Tonel, Moutinho, Izmailov, Pereirinha, Romagnoli, Vukcevic e Postiga já era campeão por esta altura.

5. Diz-se que Liedson fez um jogão, que continua a levar o Sporting às costas e que vai ficar mais uns anos em Alvalade. Em relação à última destas notícias, tenho a dizer que lamento, mas até 2012 (ano do termo do novo contrato do Levezinho, segundo consta), haverá apenas dois candidatos ao título: Benfica e Porto. Quanto ao jogo em si, ao contrário do que se disse, Liedson fez um jogo medíocre, mais um. Destaco dois lances que ilustram o modo primitivo com que se vê futebol em Portugal e que está na base do facto de se continuar a idolatrar um jogador absolutamente banal como ele: primeiro, aquela bicicleta na área, quando Postiga estava atrás de si, em muito melhores condições para finalizar; depois, aquela bola que recupera a meio do meio-campo adversário e com a qual tenta fazer um chapéu a um guarda-redes que já tinha voltado para a baliza há meia-hora. Além de o remate nunca poder dar em golo, foi um balão tão grande que mesmo que o guarda-redes ainda não tivesse regressado, podia ir tomar café, limpar o pó à casa, voltar e apanhar a bola. Mas o público aplaudiu. Mesmo tendo Liedson feito um disparate quando poderia ter iniciado uma jogada de perigo, face ao desposicionamento da defesa do Estrela. Depois, fala-se na assistência para Postiga como se fosse uma coisa extraordinária. Mas alguém viu o lance como deve ser? A movimentação é horrível, aproximando-se de Pedro Silva quando este tem a bola e obrigando-o a desenvencilhar-se sozinho. Por sorte, Pedro Silva conseguiu vir para dentro, o que soltou Liedson. Depois, um cruzamento com a bola a saltitar é uma coisa dificílima de efectuar. É isso e fazer um ovo estrelado. E então quando comparam essa assistência à do Postiga, na segunda parte, para o mesmo Liedson (que falha vergonhosamente), só podem estara gozar. A exibição de Liedson salda-se por um golo, num lance em que a defesa do Estrela está muito mal colocada. O resto são disparates, burrices e a alcateia das bancadas a uivar cerimoniosamente.

6. Ainda Liedson. Há quem diga que ele faz a diferença. Vamos ver. Tem esta época uma média de 0,64 golos por jogo, o que até é melhor do que a sua média desde que está em Portugal. Comparemo-lo com outros avançados do nosso campeonato. Cardozo tem o mesmo número de golos, mas a sua média é bem superior: 0,76 golos por jogo. Farias tem 7 golos e uma média de 0,90 golos por jogo. Nuno Gomes tem 7 golos e uma média de 0,58 golos por jogo. De facto, Liedson faz uma diferença do caraças.

7. Lá por fora, Arshavin marcou 4 ao Liverpool. Isto depois de os pupilos de Benitez terem encaixado 7 golos numa eliminatória da Champions. Mas há quem defenda que o Liverpool é a equipa que melhor defende na Europa. Está certo. Quer-me parecer que eles até são certinhos a defender quando jogam enfiados lá atrás. Mas quando têm que ir para cima do adversário, dão quilómetros de espaço. Isso não é defender bem. Isso é defender muito. E é sobretudo abdicar de lançar muitos elementos na frente para os ter cá atrás. O Liverpool não é a melhor equipa europeia a defender, porque defender também é atacar. E, quando ataca, o Liverpool defende francamente mal.

8. Chocante, chocante, era eu dizer que a melhor equipa europeia a defender é o Barcelona. Mas digo-o. Por várias razões. Primeiro, porque percebe que a melhor maneira de defender é ter a bola. Segundo, porque é das poucas equipas que, balanceadas para o ataque, se mantém posicionalmente equilibrada. Terceiro, porque não separa o acto de defender do de atacar. Quarto, porque em situação defensiva, mesmo pressionando alto, mesmo utilizando um bloco alto, ocupa na perfeição os espaços e mantém os sectores unidos.

9. Sobre futebol, há poucas coisas que vale a pena ler. Uma delas é a crónica semanal de Johan Cruijff. Na da semana passada, diz o seguinte: "La gente puede pensar que, jugando así, gastas muchas energías. No es verdad. Jugar el balón rápido, con las líneas juntas, requiere más un esfuerzo mental que físico. Si consigues jugar siempre en campo contrario, te cansas menos. Y robar muchos balones en campo del rival no es sinónimo de correr a lo loco, sino de correr lo justo hacia atrás para luego tener que correr poco hacia delante porque ya estás adelantado. Otra vez es el Barça, con su estilo, el que te lleva al engaño. Por su manera de jugar, corre menos de lo que parece. Por eso los jugadores parecen más frescos que el rival. Porque mientras unos sufren sin el balón, los otros se divierten." A melhor maneira de jogar futebol é divertindo-se, diz, entre outras coisas, Cruijff. Este Barcelona diverte-se tanto que no primeiro golo frente ao Valência, esta semana, parecia mesmo que estavam a gozar com os outros. De resto, nada a acrescentar ao que diz Cruijff: o Barcelona, a jogar como joga, despende menos energias que os adversários. Não será por falta de frescura...

10. Entretanto, o Real, aos trambolhões, vai encurtando terreno para o Barça. Sem jogar bem, mais com o coração e com Raúl do que com ciência, a equipa de Juande Ramos chega à fase derradeira do campeonato, em vésperas de clássico no Bernabéu, apenas a quatro pontos dos catalães e com a vantagem de não jogar a meio da semana. Vou-me armar em vidente e fazer um previsãozinha: só por azar é que a remontada não acaba já para a semana.

sábado, 18 de abril de 2009

Més que un club

Que há diferenças entre ver um jogo num estádio ou um jogo pela televisão, toda a gente sabe. A maior parte das pessoas, porém, resume essas diferenças a coisas insignificantes, como o facto de um jogo ao vivo propiciar maiores emoções ou a impossibilidade de assistir às repetições dos lances. Considero que os ganhos de ver um jogo ao vivo excedem em muito as perdas. Mas ao dizer isto não o faço pelas razões mais comuns. Na minha opinião, o principal ganho prende-se com a possibilidade de não se estar a olhar para a bola a todo o momento, coisa que na televisão acontece. Ao contrário, portanto, do que acontece nas transmissões televisivas, um espectador no estádio, com a devida atenção, pode perceber com muito mais facilidade tudo o que acontece numa equipa para além daquilo que acontece perto da zona onde está a bola.

O preâmbulo anterior tem o condão de justificar as asserções que farei de seguida. Dito isto, tive a oportunidade de assistir ao vivo, há dias, em pleno Camp Nou, ao desafio que opôs o Barcelona ao Recreativo de Huelva, a contar para o campeonato espanhol. O jogo foi pouco intenso do ponto de vista emocional, não teve oscilações significativas e foi quase sempre jogado ao mesmo ritmo. Não terá sido um dos melhores jogos do Barcelona, tal a abundância de boas exibições, mas a verdade é que a equipa catalã fez o jogo que mais lhe interessava. Marcou cedo, geriu a vantagem, sempre com mais bola que o adversário, e geriu as expectativas e as energias dos seus jogadores mais influentes. Messi, então, esteve em campo apenas para desentorpecer os músculos, como se fosse um treino de recuperação activa. Ainda assim, foi um desafio agradável, com muitos dos ingredientes habituais: trocas de bola sucessivas, bom jogo posicional e elevada concentração de todos os jogadores. Deste ponto de vista, uma vez que foi um jogo pausado, com poucas transições rápidas de parte a parte, jogado quase sempre com os conjuntos organizados, foi talvez o jogo perfeito para quem tenta perceber os pormenores mais profundos do modelo de Guardiola. Será precisamente a isso que me dedicarei de seguida.

1. Tabelas

Tentarei não referir aqui as coisas mais básicas, como o esquema táctico, a preferência por um futebol apoiado ou directo, a forma de defender (à zona ou ao homem), mas sim os detalhes que, no fundo, distinguem este Barça de qualquer outra equipa do mundo. Nesse sentido, as tabelas serão, porventura, o atributo mais indicado por onde começar. Nenhuma outra equipa no mundo valoriza tanto este gesto quanto o Barcelona. Já o era assim com Rijkaard; é-o incomensuravelmente mais com Guardiola. Pouca gente há que saiba, com rigor, a importância de uma tabela. Para muitos, a sua consequência imediata é igual à consequência imediata de um drible bem sucedido, isto é, ultrapassar um adversário. Isto não é verdade. Numa tabela, o desposicionamento do adversário é muito maior. A razão é simples e tem a ver com o número de atacantes envolvidos. Num drible, os jogadores que defendem têm apenas que se preocupar - digamos - com uma cabeça; têm que estar concentrados apenas naquilo que o jogador que tem a bola faz. A partir do momento em que este aposta em algo individual, como o drible, os defesas têm apenas de corrigir o seu posicionamento de modo a prevenir aquilo que esse jogador fará (que linhas de passe terá, que opções tem, etc.). A tabela, ao envolver dois atacantes, exponencia as dificuldades imediatas da defesa, pois há que ter em conta o que duas cabeças estarão a pensar. Não é, por isso, raro que numa tabela o defesa batido demore muito mais a reagir do que num drible. Mas a maior eficácia de uma tabela em relação a um drible não é a única razão existente para que a tabela deva ser tão valorizada. Sobretudo porque maior parte das equipas continuam a ter por referência de marcação, com maior ou menor grau de exagero, os jogadores adversários, uma tabela, sendo algo que envolve mais do que um atleta e movimentações constantes, é sempre algo que propicia reajustamentos defensivos constantes e uma forma eficaz de manter em permanente movimento os defesas contrários. O Barcelona de Guardiola usa com mestria a tabela. Fá-lo não só para romper linhas adversárias, mas também por uma série de outras coisas. Fá-lo, por exemplo, para sair de zonas de pressão, para manter a posse de bola, para desorganizar momentaneamente a zona onde a bola se encontra, para chamar a atenção do adversário, fazendo depois a bola viajar com celeridade para zonas de menor concentração de defesas ou até mesmo como forma de treino ou mero divertimento. Isto leva-me para o segundo ponto.

2. Falta de objectividade

Há quem diga que jogar bem não é jogar bonito. Normalmente, isto acontece porque baseiam o conceito de bonito em algo que não o é, na verdade. Em futebol, ou em tudo o que tem um carácter objectivo, o bonito é o que satisfaz essa objectividade. Ou seja, é igual ao bom. Jogar futebol bonito não é andar a fazer cabritos ou cuecas, não é fazer passes longos a toda a hora ou fintar três adversários no sentido contrário à baliza; é jogar bem. Ao contrário do que estas pessoas diriam, o futebol do Barcelona não é atractivo porque é bonito; é atractivo porque é bom. E é bonito porque é bom. Essencialmente, é um futebol em que a taxa de opções correctas é muito elevada. E esta taxa é aquilo que, em futebol, define o que é bom e, por arrasto, o que é bonito. O futebol deste Barcelona é, na sua essência, isto: uma taxa de boas opções francamente superior a toda a concorrência. O seu futebol é reconhecidamente formidável graças à qualidade das opções dos seus jogadores. Isto permite, como consequência, que a equipa tenha uma taxa elevada de passes acertados, bem como a facilidade de progredir em posse. Neste momento, os que discordam de mim, dirão que há equipas que não jogam tão bonito, isto é, de forma tão atractiva, mas que jogam igualmente bem, isto é, são igualmente equipas eficazes e competentes no que diz respeito à objectividade. A divergência de opinião terá unicamente a ver com o conceito de "objectivo". Para maior parte das pessoas, o objectivo do futebol é o golo, ou a vitória. Nesse sentido, uma equipa joga bem se cumprir ou fizer tudo o que estiver ao seu alcance para cumprir esse objectivo. Assim, uma equipa que jogue de forma directa, sem "rodriguinhos", com um ritmo elevadíssimo, sempre com vista à vitória, fará um bom jogo. Não concordo com isto. E a razão prende-se com o facto de não concordar que o objectivo do futebol seja o golo ou a vitória. Como o defendi aqui, o objectivo do golo é um objectivo circunstancial, que só é activado no momento de chutar à baliza. Todos os outros momentos têm por objectivo fazer o melhor possível para passar ao momento seguinte. O objectivo do futebol não é assim o golo ou a vitória, mas sim o fazer o melhor em cada momento. Ora, o Barcelona adopta uma filosofia que se identifica claramente com isto. Em muitos momentos do jogo - eu diria mesmo na maior parte deles - a equipa está menos interessada em marcar golos do que em manter a posse de bola ou fazer o que é melhor a cada momento, ainda que isso implique cinco ou seis acções para progredir o mesmo que poderia progredir numa só acção. Mas o que é mais interessante é que há ocasiões, mesmo quando o resultado está nivelado, em que o futebol do Barça é absolutamente contra-intuitivo. Em certas alturas, quando outra equipa qualquer aproveitaria para progredir no terreno ou para impor velocidade, o Barça joga para trás, envolve-se em tabelas aparentemente inconsequentes e diverte-se a trocar a bola entre os seus jogadores, sem qualquer objectivo aparente. Não é raro, por exemplo, vermos um passe vertical em que o jogador que recebe a bola se pode virar, pois tem espaço, e progredir perigosamente, mas não o faz, preferindo tabelar ou jogar para trás. Estes lances, na minha opinião, definem este Barcelona. As coisas, obviamente, não se fazem apenas por fazer e a ausência de objectividade é apenas aparente. Há, nestes gestos, o reflexo óbvio da forma de estar em campo da equipa. Tabelar quando pode progredir, jogar para trás quando tem espaço para a frente, fazer passes absolutamente inconsequentes quando tem espaço para avançar, são formas de treinar, de mecanizar, de criar rotinas nos jogadores. Preferir trocar a bola sem qualquer espécie de objectividade é precisamente aquilo que os deixa, depois, completamente confortáveis a jogar de costas para a baliza, a fazer tabelas, a considerar apoios, a romper linhas em trocas de bola sucessivas. O divertimento incosequente acaba por funcionar como treino, ou seja, por ter consequências, ainda que não imediatas.

3. Simplicidade Complexa

Muita gente há também que considera o futebol do Barcelona de uma simplicidade incrível. E consideram que essa simplicidade é louvável. O futebol do Barça não tem nada de simples. O facto de aquilo que eles fazem parecer simples deriva do erro comum de não se valorizar coisas como um passe de dez metros, quando são claramente mais complicadas de fazer do que outras que muitas vezes se consideram difíceis, como dribles fantásticos ou remates fortíssimos. Fazer um bom passe envolve tantas variáveis que é um gesto muito mais difícil do que se pensa. E a essência do Barça é o passe. Simplesmente, um pequeno passe não é só um pequeno passe; é um conjunto de movimentos coordenados entre todos os elementos da equipa. A simplicidade do Barcelona não é simples, não é só um futebol de "toca e foge" constante; cada "toca e foge" joga com todas as movimentações dos outros jogadores. Jogar como o Barça joga, com uma tal qualidade de troca de bola, só é possível porque existe uma coordenação colectiva fantástica e porque a movimentação de todos os colegas sem bola é de tal forma correcta que propicia, a cada instante, variadíssimas soluções de passe ao portador da bola. A aparência da simplicidade é o resultado de um processo muito complexo.

4. Atacar de forma verdadeiramente colectiva

Para muita gente, ser bom tacticamente é saber arrumar defensivamente a equipa. Para outros, acresce a isto o mecanizar o melhor possível os momentos de transição. Assim, uma equipa só é colectiva em momento defensivo ou quando está em transição. Daí que, a nível ofensivo, se pense que um treinador só pode treinar, isto é, rotinar, o momento da transição defesa-ataque. Para estas pessoas, em ataque organizado, o que conta é a qualidade, a inspiração, os atributos individuais de cada um dos jogadores, e não nada que possa ser mecanizado. Isto é absolutamente falso. E a maior lição de Guardiola, este ano, é precisamente essa. É indubitável que as individualidades influenciam a qualidade com que o colectivo manobra, mas é tão possível defender bem sem grandes individualidades do ponto de vista defensivo como é possível atacar bem sem grandes individualidades do ponto de vista ofensivo. Isto, claro, se essa falta de individualidades for compensada por um desempenho colectivo relevante. Uma equipa que defenda à zona, e a entreajuda entre os jogadores, as compensações, o posicionamento em função dos colegas estiver correcto, é óbvio que minoriza a falta de qualidade individual de cada um dos atletas, pois estão menos expostos às suas debilidades. Mas por que não seria assim em termos ofensivos? A falta de explosão de um extremo não pode ser compensada utilizando uma tabela com um companheiro? Claro que pode. E se não tem capacidade de ultrapassar o adversário pelo drible, tem-no certamente com uma tabela, por mais lento que seja. Daí que todo o gesto colectivo seja uma arma para compensar a individualidade. Este Barcelona ataca de forma verdadeiramente colectiva. Ao jogar em constantes tabelas, num futebol claramente apoiado, de toque curto, de passes verticais, de exploração do espaço entre linhas, está a valorizar não as características individuais dos seus atletas, mas as relações entre cada um deles. Não é, portanto, na qualidade individual dos seus elementos, mas sim na relação entre eles que reside a força ofensiva do Barça.

5. Qualidade individual

Há mesmo quem se atreva a dizer que o Barcelona é o que é porque tem os melhores jogadores do mundo. Isto é absurdo. Digo de caras que o plantel do Barça, em termos individuais, é claramente inferior a Manchester, Chelsea, Liverpool, Milan, Inter e Real Madrid, pelo menos. Tirando Messi e Daniel Alves, que serão os melhores na sua posição, e ainda Iniesta e Xavi, que estarão certamente com Van der Vaart, Guti, Sneijder, Fabregas, Gerrard, Lampard, Essien, e Diego nos 10 melhores médios-ofensivos do planeta, os restantes jogadores estão bem abaixo dos melhores do mundo. Valdez é um guarda-redes banalíssimo, claramente inferior, por exemplo, tanto a Casillas como a Reina, seus colegas na selecção. Puyol e Marquez são bons centrais, mas inferiores a Cannavaro, Córdoba, Rio Ferdinand, Ricardo Carvalho ou John Terry. Piqué tem um potencial fantástico e de Cáceres antevêm-se muito boas coisas, mas estão longe dos melhores do mundo. Abidal está longe dos melhores defesas-esquerdos do mundo. Yaya Touré ou Keita não são Pirlo, Gago, Cambiasso, Mikel, De Rossi, Mascherano, Xabi Alonso ou Carrick. Henry já foi, um dia, dos melhores do mundo. Hoje em dia está longe disso. Eto'o tem à sua frente, pelo menos, Ibrahimovic, Van Nistelrooy, Raul, Rooney, Berbatov, Tevez, Fernando Torres e Drogba. Argumentar isto é querer tapar o sol com uma peneira.

6. Zona Perfeita

Uma das coisas que ver um jogo num estádio facilita é poder perceber, em rigor, como funciona o movimento zonal da equipa sem bola, ou como esta reage à perda de bola e como efectiva o seu pressing. Digo-o sem grandes rodeios: a zona do Barcelona é fenomenal. A forma concentrada com que, por exemplo, os seus defesas encaram um lance disputado longe de si é fantástica.Por exemplo, em jogada a decorrer do lado esquerdo, a forma como procuram assegurar uma linha recta perfeita, ligeiramente na diagonal (aproximando-se da baliza quanto mais se afasta da bola), com os seus jogadores bem perto uns dos outros e preparados para correr caso uma bola passe para as suas costas, é soberba. Em termos de pressing, é absolutamente zonal, sem qualquer preocupação com adversários, assegurando a cada instante uma ocupação perfeita dos espaços. A facilidade que tem em fazer campo pequeno, chegando por vezes toda a equipa a ocupar menos de metade da largura do campo, faz deste Barcelona uma das melhores equipas do mundo a reagir à perda de bola. Esta eficácia, aliada depois à concentração e ao rigor posicional quando não tem bola, fazem desta equipa tão ofensiva uma equipa defensivamente muito bem preparada. O seu pressing é preferencialmente efectivado juntos às linhas, preocupando-se a equipa, em primeiro lugar, em fechar os espaços centrais, fazendo os três atacantes juntarem-se no meio, e em motivar o adversário a ir para a linha.

7. Apoios

Muito da capacidade do Barcelona passa pela facilidade que tem em criar apoios constantes. Quanto mais apoios houver, mais soluções tem quem leva a bola e mais fácil é fugir à actividade defensiva do adversário. A forma de jogar sem bola deste Barcelona potencia, em muito, essa facilidade. Ao contrário do que muitas vezes se pensa e do que, à partida, parece ter mais lógica, nem sempre faz sentido, quando a equipa tem bola, fazer o chamado "campo grande", isto é, dispor os jogadores o mais afastados de si de forma a preencherem todos os espaços do campo e a haver mais espaço para jogar. A principal intenção deste tipo de estratégia é levar o adversário, se este jogar ao homem, a abrir brechas entre os seus elementos. Mas contra equipas que joguem bem à zona, isto não acontece. Pode, de facto, haver mais espaço para receber a bola, mas haverá menos espaço para furar. Na prática, as equipas podem lateralizar infinitamente o jogo, se tiverem qualidade para isso, mas não ganham nada com isso se os adversários, defensivamente, forem bem organizados. Fazer "campo grande" faz sentido quando tem de fazer sentido. E ao contrário do que se pensa, este Barcelona não joga extremamente aberto, com os jogadores a darem sistematicamente largura e profundidade. É raríssimo que os dois extremos, em processo ofensivo, estejam os dois abertos ao mesmo tempo; é raríssimo que os dois médios-ofensivos estejam longe um do outro. Há sempre gente perto uma da outra. A equipa evolui em harmónio e não de forma rectilínea, torcendo-se sobre si mesma para permitir que os laterais dêem profundidade ou que o avançado baixe para tabelar com o médio. O Barcelona não faz "campo grande" a não ser quando lhe interessa e é até, muitas vezes, uma equipa encolhida, jogando em pouco espaço de terreno, quer seja a defender, quer seja a atacar, só esticando o jogo quando o adversário fica emaranhado na teia de apoios que conseguem criar. Os seus jogadores, por causa disto, têm a possibilidade de correr menos, uma vez que têm menos espaço para cobrir.

8. Ausência de passes longos

O passe longo, em Barcelona, é gesto non grato. Não se vêem, praticamente, passes longos, num jogo do Barcelona por várias razões. Primeiro, porque a equipa passa maior parte do jogo em organização, não havendo, por isso, da parte do adversário, tanto espaço. Segundo, porque usar o passe longo entra claramente em choque com aquilo em que se acredita e com as próprias faculdades da equipa, que tem a sua força na forma como circula a bola. Não se vê, por uma única vez que seja, um central a sair a jogar com um passe longo, mesmo estando, muitas dessas vezes, um extremo claramente aberto e com todas as condições para receber a bola. Não, isso não acontece porque isso seria queimar etapas e desvirtuar o modelo de jogo. O Barcelona precisa de evoluir de forma sustentada e é nisso que é forte. Não faz sentido, mesmo quando é mais fácil, apostar no passe longo. Depois, mesmo diagonais ou movimentos verticais dos médios que propiciem um passe para as costas da defesa são apenas movimentos estéreis ou dinâmica sem bola, usada para distrair o adversário daquilo que verdadeiramente importa ou para arrastar marcações. É muito raro, por exemplo, que as diagonais de Henry sirvam para que os defesas ou o médio-defensivo lá ponham a bola. Isto em primeiro lugar, faz com que o Barcelona não perca a posse de bola, aquilo que, no fundo, lhe confere identidade, e depois com que a equipa explore novos espaços, como consequência dessas movimentações.

9. Ritmo

Antes da partida com o Recreativo, Guardiola disse que a sua equipa teria de tentar evitar um ritmo de jogo baixo e tranquilo, pois isso interessava ao adversário. Para evitar isso, o treinador do Barça dizia que seria importante circular bem a bola. O ritmo elevado de jogo não é senão o ritmo elevado a que a bola circula. Nesse aspecto, sim, o Barcelona tem um ritmo de jogo frenético, se for preciso. Mas não é uma equipa constantemente vertical, constantemente a tentar chegar à frente. O seu ritmo de jogo, isto é, a intensidade com que ataca as redes adversárias, não é alto. E isso é um pormenor importantíssimo. Jogar apoiado, em toque curto, de forma segura, privilegiando a posse de bola não é compatível com um ritmo de jogo elevado, pois os riscos de efectuar maus passes aumenta com o aumento do ritmo de jogo. O Barça troca velozmente a bola, mas não joga velozmente. A sua evolução defesa-ataque é, porventura, das mais demoradas do mundo, servindo essa demora para a equipa se manter unida e apoiada, o que permite crescer por etapas, sempre em condições de ser ela a mandar na partida.

10. Dois médios-ofensivos

Para muitos, o esquema táctico, isto é, a disposição dos jogadores em campo não tem qualquer influência na forma como a equipa joga, uma vez que são as dinâmicas que interessam, e qualquer esquemo táctico permite jogar de todas as maneiras com igual eficácia. Para esses, o Barcelona poderia jogar da mesma forma em 442 clássico, por exemplo. Não concordo com isto. Aliás, imaginar que só as dinâmicas têm importância, numa equipa, seria imaginar, por exemplo, que não há qualquer razão lógica para um treinador optar por um esquema táctico em vez de outro. Sinceramente, este Barcelona, com outra qualquer táctica, era outra equipa, jogaria de forma absolutamente diferente. Uma das coisas mais importantes, porventura, é a utilização de dois médios-ofensivos. Já nem vou falar das características individuais dos médios que jogam nestas duas posições, apesar de elas serem únicas, no futebol europeu, mas é completamente diferente jogar em 433 com dois médios-ofensivos de jogar, por exemplo, apenas com 1, em 4231. Em termos ofensivos, a presença de mais um jogador permite à equipa, em zonas avançadas do terreno, uma rede de apoios muito mais eficaz. Depois, haver dois médios-ofensivos potencia um pressing muito mais alto, uma melhor ligação entre meio-campo e ataque e, em termos gerais, uma melhor arrumação dos jogadores em função do espaço ocupado pela equipa.

11. Movimentos típicos dos extremos com bola

Seja Messi na direita, seja Henry ou Iniesta ou Bojan na esquerda, o movimento típico dos extremos é virem para dentro. A partir dessa altura, a colocação do médio-ofensivo e do avançado é absolutamente sistemática. A forma mecânica como a equipa se comporta quando os extremos têm a bola indicia um trabalho específico a esse nível. Este é mesmo um bom exemplo de como é possível trabalhar, e muito, em termos ofensivos, uma equipa. Aliás, na verdade, é um bom exemplo de como o Barcelona, ofensivamente, é uma equipa quase exclusivamente colectiva. Assim que o extremo agarra na bola e flecte para o meio, o médio procura imediatamente ocupar um espaço recuado, dando uma opção de passe recuada, necessária caso o meio seja fechado por um dos médios, e conferindo uma cobertura em caso de perda de bola. Ao mesmo tempo, o lateral desse lado inicia a marcha para que, caso a bola baixe para o médio que deu apoio, esteja já numa posição avançada para receber novamente a bola naquele lado. Ao mesmo tempo, o ponta de lança desce e aproxima-se do extremo que conduz a bola. Ao mesmo tempo, o extremo do lado contrário aproxima-se da posição de ponta-de-lança e é o lateral do lado contrário que vai iniciar a marcha para dar profundidade. Normalmente, o lance termina com o extremo a jogar no avançado, que ou dá no médio de frente, ou tabela de primeira com o extremo, que entretanto entrou entre os defesas contrários.

12. Verticais ou diagonais sem bola e passes verticais

Outro dos movimentos ofensivos mecanizados na equipa são as verticais ou as diagonais sem bola. Normalmente, um dos médios-ofensivos volta-se para trás e joga a bola no médio-defensivo. Nesse momento, o outro médio-ofensivo inicia um movimento umas vezes vertical, outras diagonal, mas nunca recebe a bola. Esta é novamente endereçada ao mesmo médio-ofensivo, num passe vertical, e este agora tem mais espaço, fruto da desmarcação do colega, que arrastou adversários. A partir daqui, a bola entrará nas linhas ou subirá no ponta-de-lança, que tem por hábito descer para dar um apoio vertical, sendo um dos extremos a dirigir-se, na diagonal, para o centro do ataque. Outro movimento sem bola semelhante, com os mesmos fins, são as diagonais dos extremos. Associado a isto está a quantidade incrível de passes verticais, rasteiros, que a equipa consegue. Com estes passes, usualmente propiciados por estas movimentações ilusórias, a equipa progride verticalmente no terreno sem levantar a bola do chão, de forma segura, etapa a etapa.

13. Bolas paradas defendidas à zona.

O Barcelona defende os cantos à zona, colocando, por norma, 8 jogadores zonalmente e ainda um à entrada da área. Isto poderá variar de adversário para adversário, mas é usual não colocar nenhum jogador em nenhum dos postes (o que não deixa de ser curioso, tendo em conta maior parte das zonas), um jogador na zona do primeiro desvio, na linha vertical da pequena área, uma linha de quatros jogadores na linha de pequena área e ainda outra linha, um pouco mais adiantada que esta, com três homens nos intervalos dos outros quatro. Um dos defeitos que se aponta ao Barcelona, ou uma das dúvidas em relação à sua capacidade competitiva, prende-se com os lances de bola parada. Diz-se que a equipa é muito permeável de bola parada, mas dos 24 golos sofridos na Liga apenas 3 foram de bola parada, ao passo que, na Liga dos Campões, só 2 em 12 (excluo os livres directos). Só 1 em cada 6 golos sofridos são de bola parada, pelo que me parece francamente exagerado falar de permeabilidade nesses lances.

14. Importância da parte estratégica do jogo

Guardiola dá especial atenção aos seus adversários e prepara a equipa para certas nuances estratégicas, condicionadas pelo adversário. Contra o Recreativo, um exemplo claro desse lado estratégico, e que dificilmente terá sido perceptível pela transmissão televisa, foi o posicionamento defensivo aquando de um pontapé de baliza do adversário. Saberia, por certo, Guardiola que o Recreativo batia todos os pontapés de baliza para o lado direito do seu ataque, e colocou a sua equipa toda fechada nesse preciso espaço, em duas linhas de quatro jogadores, uma composta pelos centrais, a outra pelos médios e Henry, que, com Busquets, ocupava a zona onde a bola cairia. Para se ter uma ideia, Daniel Alves era o homem mais à direita desta zona e encontrava-se uns bons metros para cá da linha de meio-campo, ficando a equipa toda encolhida em 20/25 metros de largura e pouco mais de comprimento. Sabendo para onde o Recreativo bateria os seus pontapés de baliza, o Barcelona concentrou os seus onze jogadores numa área reduzidíssima de terreno, ganhando, quase de certeza, se não a primeira, pelo menos a segunda bola.


15. Rotatividade do plantel

Outro dos aspectos que merecem referência é a gestão de esforços que Guardiola tem sido obrigado a fazer nos últimos tempos. Ao contrário de grande parte dos treinadores, que optam por fazer descansar jogadores-chave em jogos do campeonato que antecedem desafios da Liga dos Campeões, a gestão de Guardiola, ainda que pretenda o mesmo, efectua-se de forma diferente. Além de nunca fazer descansar muitos dos titulares ao mesmo tempo (4 ou 5, no máximo), mantendo assim a competitividade da equipa, maior parte dos jogadores que serão utilizados no jogo seguinte e que ficaram inicialmente no banco acabam por entrar na partida, fazendo alguns minutos, mesmo que o resultado esteja garantindo. A ideia é óbvia e pretende manter os jogadores com ritmo de jogo. Isto faz todo o sentido. Se evitar o desgaste físico de uma partida de 90 minutos é importante, não nos podemos esquecer que nesse dia não há treino. Fazer eventuais titulares descansar, mas dando-lhes 20 ou 30 minutos para manterem o contacto com a competição é uma forma de gerir energeticamente e psicologicamente um plantel que me parece ter muito mais lógica. Outro exemplo da gestão da fadiga por parte de Guardiola está em Iniesta. O espanhol é um dos titulares indiscutíveis, mas nesta fase de dois jogos por semana nunca foi poupado, numa intenção clara de manter um jogador que passou algum tempo lesionado com um ritmo de jogo cada vez mais alto e apurado.

Resumindo, este Barcelona, definido pela expressão catalã que encabeça este texto, é mesmo mais do que um clube. Não querendo apropriar-me do sentido exacto da expressão, que encerra questões políticas e culturais bem mais fortes e que não são chamadas para o caso, considero este Barcelona bem mais do que uma equipa normal, no sentido em que funciona de forma totalmente diferente, com princípios bem próprios e uma mentalidade incrivelmente distinta. O prazer que extraio ao ver esta equipa jogar e todo o reconhecimento que agora lhe dão é uma espécie de vitória ideológica. Afinal, nenhuma equipa, na actualidade e não só, reflecte com maior exactidão aquilo que se defendeu desde sempre no Entre Dez como este Barcelona. Guardiola e o seu Barça são o rosto visível das ideias deste espaço e o seu sucesso será também o sucesso dessas ideias.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Momentos

A semana e meia que passou foi pródiga em episódios caricatos. É sobre eles que irei falar.

1. Luis Sobral voltou a dizer porcaria. O artigo completo pode ser lido aqui, mas vou deter-me na frase central: "Só há duas verdadeiras razões para seguir uma partida do futebol italiano: ver jogar Ibrahimovic, ver protestar José Mourinho." Ou seja, para Luis Sobral, o futebol italiano é uma trampa e só se aproveita Ibrahimovic e Mourinho (este porque protesta). Fica implícito que o resto do futebol italiano não vale nada e que nem sequer merece o sueco. Resta saber que futebol é que Luis Sobral aprecia, então. Se a liga mais competitiva do mundo não o satisfaz, talvez prefira a segunda liga do Azerbeijão. São gostos. Ainda bem que há liberdade de expressão.

2. Por cá, tivemos um senhor a armar um circo e a acabar feito palhaço. Falo de Queiroz. Pegou num pormenor insignificante e que deveria ser incentivado, fez dele um cavalo de batalha e reprovou-o. Pereirinha e Rui Pedro ousaram fazer uma coisa diferente e tiveram de prestar contas à Inquisição. Não satisfeito com a reprimenda apalermada de Rui Caçador, o seleccionador principal decidiu suspender os jogadores. Não sei se Queiroz terá aprendido com Paulo Bento a castigar todo aquele que revela uma personalidade ambiciosa, mas parece-me claro que o 25 de Abril em sua casa é dia de trabalhos forçados.

3. Entretanto, o Portimonense saiu em defesa de Rui Pedro, sendo que o jogador nem sequer pertence aos quadros do clube. Do Sporting, nem uma palavra de apoio ao capitão da selecção de sub-21. Miguel Veloso bem avisou que os jogadores não têm apoio de ninguém.

4. Ainda sobre o mesmo assunto, a reacção de Caçador e de Queirós foi a de enfatizar até ao absurdo o incidente. Outros, como eles, acharam que aquilo que os jovens fizeram foi repugnante, irresponsável e uma forma de menosprezar o adversário que ilustra a falta de valores e de humildade no nosso país. Ao contrário disto, lembram os valores morais e a dignidade de outros povos, numa atitude provinciana levada ao extremo. O que eu gostava mesmo de saber era o que é que essas pessoas diriam se vissem Henry e Wenger, no flash interview a seguir ao jogo em que o mesmo Henry e Robert Pires falharam um penalty idêntico, a rirem que nem perdidos da situação. Se calhar também são portugueses e também não têm humildade. Destaco as sábias palavras de Wenger, ditas por entre um sorriso, enquanto os jogadores do Manchester City se sentiam desrespeitados: "também faz parte do jogo cometer este tipo de erros". Pois faz. Também concordo que há uma diferença de mentalidades: Wenger não tem a tacanhez de Queiroz.

4. Provavelmente satisfeito com o pulso forte que demonstrou, Queiroz não fez a barba para o jogo com a Suécia. Se tivesse que adivinhar, diria que o seleccionador se cortou da última vez que fez a barba e decidiu castigar as lâminas de barbear por falta de responsabilidade.

5. Entretanto, antes do jogo com os nórdicos, Cristiano Ronaldo, confrontado com o porquê de não render tanto na selecção quanto no Manchester United, disse o seguinte: "Se todos fizessem o que fiz, éramos campeões mundiais". A única coisa que podemos depreender daqui é que Pereirinha e Rui Pedro, infelizmente, têm de se aguentar à bomboca, pois não são Cristiano Ronaldo. Ou seja, tentar marcar um golo de uma maneira diferente, mostrando criatividade e ao mesmo tempo coragem, é motivo para ser castigado; dizer abertamente que nem todos se esforçam como ele é um comportamento louvável. Viva a liberdade de interpretação.

6. Vieram finalmente os suecos e Portugal não jogou nada. Há quem diga que Portugal se fartou de jogar à bola, mas estes se calhar têm medo que Queiroz os castigue se disserem o contrário. Portugal atacou muito, correu muito, impôs um ritmo alto. Nada disto é jogar bem. Houve intensidade, houve vontade de ganhar, houve atitude, houve garra, houve compromisso. Só não houve ideias. Infelizmente, não houve a única coisa que era preciso ter havido. E o futebol praticado foi uma coisa irracional, sempre a uma velocidade estonteante, como se cada jogador tivesse de ir tirar o pai da forca. Futebol não é halterofilismo; joga-se com a cabecinha. Resultado: meia-dúzia de lances interessantes em 90 minutos e tantas oportunidades de golo para um lado como para o outro. A Suécia, uma selecção absolutamente banal sem Ibrahimovic, sem ter feito nada por isso, por pouco não ganhava o jogo.

7. Receita para o sucesso: jogar com um central a trinco porque os outros são grandes, jogar com o Bruno Alves de início, jogar a segunda-parte toda com 4 centrais de raiz em campo, tirar Tiago quando era o único com ideias, manter no meio-campo Meireles e Pepe, não colocar a jogar Nani nem Moutinho, trocar Danny por Hugo Almeida. Poderia acrescentar outras: apostar em Eduardo, não convocar Nuno Gomes, Postiga, Quim, Zé Castro, Fernando Meira, Pedro Mendes, Carlos Martins nem Quaresma. Estou de certeza a esquecer-me de mais qualquer coisa.

8. Imagem de marca do desafio: Queiroz com as mãos na cabeça, provavelmente a cogitar quem é que iria castigar por Cristiano Ronaldo falhar aquele golo.

9. Três jogos em casa, duas equipas medianas e uma fraca, dois empates e uma derrota; 5 jogos, 1 vitória, 6 pontos, três jogos sem marcar, 7 pontos de distância para o primeiro. São os números de Queiroz. Não seriam números maus, se Queiroz fosse seleccionador da Albânia. Assim, é a matématica a lixar a vida ao professor. O próximo a ser castigado é o Pitágoras, por ter ajudado a que houvesse forma de fazer contas.

10. Jogo amigável com a África do Sul. Ganhámos 2-0. Dois golos de bola parada, em dois falhanços incríveis da defesa sul-africana. Viva! A pergunta que se impõe é: para que é que Queiroz convocou três guarda-redes se dois deles nem no amigável entraram? Ou foram castigados a meio do estágio por terem sido encontrados a jogar ao berlinde?

11. A selecção B também jogou e Queiroz esteve na bancada. Acho que depois disso já castigou o operador de câmara que o filmou a roer uma unha. Do jogo em si, é sempre bom destacar o golo de Djaló, bem como o facto de nenhum dos jogadores portugueses ter sido castigado. Pelé fez 30 passes de ruptura inconsequentes e continua um senhor jogador.

12. Na zona sul do nacional de juniores, o Sporting foi vencer ao Seixal o Benfica, dando um passo seguro rumo à fase final. O Belenenses, que vai a Alcochete esta semana, ficou a 1 ponto do Benfica, que não contará com Nélson Oliveira nos próximos jogos, por ter sido expulso. Acho que Queiroz pensou em castigar toda a equipa do Sporting por ser muito melhor que a do Benfica.

13. Se os filhos do Queiroz aparecerem com um olho à belenenses, aposto que foi por o pai ter encontrado os miúdos a dizer que o Ibrahimovic jogava para caramba.

14. Na Liga, Lisandro foi castigado por ter simulado um penalty frente ao Benfica. Isto cheira-me a coisa do Queiroz.