domingo, 30 de dezembro de 2012

Gente Irritante e Coisas Ilógicas

Ser mais irritante do que João Querido Manha, e dizer tantos disparates quantos o do comentador residente da TVI, não é obra ao alcance de qualquer um. Basta, a título de exemplo, lembrar o que disse hoje tal senhor, a respeito do futebol apresentado pelo Sporting. Segundo João Querido Manha, Adrien Silva e os extremos leoninos estavam muito apagados. Tendo em conta que passou o jogo a elogiar Ricardo Esgaio, ou não percebeu que Esgaio era um dos extremos, ou referia-se apenas a Jéffren. E é aqui, precisamente, que está o problema. É que, se o Sporting fez alguma coisa de interessante, sobretudo na primeira parte, fê-lo exactamente por força das acções de Adrien e Jéffren, de longe os únicos jogadores em campo que mostraram algumas ideias. João Querido Manha não viu isso, como não vê, geralmente, grande coisa, e distorceu de tal modo o que se passou que não compreendeu que os jogadores que, na sua opinião, estavam menos inspirados, eram afinal os que estavam mais inspirados. Podia alguém perceber menos de futebol?

Comecei, porém, por falar em irritação, e por dizer que bater João Querido Manha nesse particular não é fácil. Não é fácil, mas é possível, como o deixou bem claro, também hoje, mas umas horas antes, João Gonçalves, comentador da Sporttv, durante o desafio que opôs o Norwich City ao Manchester City. Durante a partida, fui percebendo nos comentários ao jogo uma certa embirração, aparentemente gratuita, com um jogador que não conhecia, o lateral direito do Norwich, Russell Martin, hoje em campo porque o habitual titular se encontrava lesionado. Tantos foram os reparos às acções de Martin em campo, na maioria dos casos quando nada se justificava, que comecei a prestar atenção ao desempenho do jogador. Não me pareceu extraordinário, mas também não me pareceu abaixo do exigível para uma equipa como o Norwich. Aliás, comparado com os dois centrais, era um prodígio. João Gonçalves, porém, insistia. A dada altura, sempre que tocava na bola (acho que às vezes bastava aparecer no ecrã), João Gonçalves dizia que era "fraquinho", que tinha medo de subir, que fazia asneira atrás de asneira. E o jogador, para quem o via sem os óculos especiais ou os estupefacientes de João Gonçalves, não fazia nem mais nem menos do que a maioria dos seus colegas. Percebi, por fim, que era qualquer embirração estúpida, que João Gonçalves tinha acordado de manhã, tinha ido ver a convocatória do Norwich, e tinha decidido, talvez por lotaria, que ia dizer mal daquele jogador em particular. Depois de perceber isto, pensei: "Bonito, bonito, era o rapaz marcar um golo". Só para ver como reagia quem tanto mal dele dizia. E, às vezes, desejar coisas apenas para ver gente estúpida envergonhada com a própria estupidez não é um desporto inútil. Hoje, pelo menos, não foi. É que, passados 5 minutos, Russell Martin marcava mesmo o segundo golo do Norwich na partida. Quando João Gonçalves se apercebeu da coisa, calou-se durante alguns segundos, e depois lembrou-se de se safar dizendo que, às vezes, o futebol tem destas coisas e o improvável acontece. Talvez por ainda me não me ver satisfeito, quem quer que exerça vontades sobre o que se passa no mundo decidiu que João Gonçalves ainda não tinha o que merecia. E eis que, alguns minutos mais tarde, o improvável voltou a acontecer: Russell Martin fazia o terceiro do Norwich e o segundo da conta pessoal. João Gonçalves riu-se, resignado com o que lhe acontecia. E o que lhe aconteceu foi simples: escolheu um jogador que não costuma jogar, ainda por cima um lateral direito, num jogo contra uma equipa bem superior, em que a probabilidade de cometer erros era algo elevada, escolheu um jogador a dedo com quem pudesse embirrar durante todo o jogo, na esperança de que, no final da partida, pudesse dizer que tinha percebido desde o início que o rapaz não era suficientemente bom para o nível que lhe era exigido, passando assim por alguém que percebe muito do que está a dizer. Infelizmente, o tiro saiu pela culatra, e a esperteza de João Gonçalves deixou antes a nu a sua falta de carácter.

Não tanto falta de carácter, mas falta de inteligência é coisa que abunda na arbitragem pelo mundo fora. E não me refiro apenas a árbitros; as próprias leis são, muitas deles, profundamente ilógicas. Por que raio parece indiscutível que agredir seja mais grave do que uma entrada por trás? Não faz sentido. Quando, então, alguém agride um adversário porque este acabou de ter uma entrada violenta e o primeiro é expulso por agressão e o segundo vê apenas um mísero amarelo, não há uma profunda injustiça em causa? Falo disto porque é algo que defendo há já muito tempo e porque, hoje, também no jogo entre o Norwich e Manchester City, voltou a acontecer. Nasri foi atropelado, quando se preparava para receber a bola, por uma entrada de Bassong que o virou ao contrário, mas que o podia ter deixado inutilizado durante muito tempo. Percebendo o que acontecera, e o perigo que acabara de correr, levantou-se irreflectidamente e foi tirar satisfações do adversário. Encostou-lhe a cabeça, e parecia com vontade de ir mais longe. Não chegou propriamente a agredir, mas terá tido vontade, e ainda fez uma meia-tentativa, meio fruste, de dar uma cabeçada. Tal tentativa, ou o que quer que tenha sido, valer-lhe-ia a expulsão. Quanto a Bassong, ficou em campo, como não podia deixar de ser, com apenas um amarelo. Para a esmagadora maioria das pessoas, tal desfecho foi normal e condizente com as acções de cada um dos jogadores: um cometeu uma falta dura; o outro agrediu, ou tentou agredir, sem bola, um adversário. O problema de quem pensa assim é que não pensa assim. Deixem-me explicar: quem pensa assim por eles é o mundo que os rodeia. Acham que tal desfecho é normal porque estão habituados a que seja isso que acontece em situações idênticas. Mas que alguma coisa seja habitual não implica que seja correcta.

Imaginemos que Nasri agrediu mesmo, para facilitar a explicação. Que acção é mais danosa à integridade física do jogador: uma entrada violenta numa jogada, ou uma cabeçada no nariz? Que acção merece maior punição: uma entrada violenta que pode inutilizar um adversário, ou uma agressão que não põe em risco a integridade física de ninguém e não é senão uma reacção perfeitamente compreensível de alguém que acabou de ser vítima de uma entrada que o podia inutilizar? Que pessoa merece maior castigo: quem comete uma entrada dessas, ou quem, por sentir ameaçada a sua integridade, reage intempestivamente a essa entrada? E, já agora, que acção é mais cobarde: aproveitar o pretexto da disputa da bola para aleijar a sério um adversário pelas costas, ou agredi-lo frente a frente, em condições iguais? Como quer que se coloque a pergunta, parece-me óbvio que nada justifica que o segundo agressor mereça maior punição do que o primeiro. Na minha perspectiva, nem sequer merecem punição igual. Nunca compreendi muito bem aqueles jogadores que ficam muito ofendidos quando alguém os agride frontalmente (não falo de pisões, de cuspidelas, nem do que quer que seja feito sorrateiramente). Enquanto jogador, sempre fiquei muito mais ofendido com adversários que tinham entradas violentas, fossem elas deliberadamente maldosas ou simplesmente irresponsáveis, do que com adversários que me tentavam agredir. A menos que fosse alguma coisa muito grave (e a maioria das agressões, em futebol, não são graves), agressões não põem em causa a possibilidade de se continuar a jogar. E esse é que deveria ser o critério. Nasri - deixem-me dizê-lo - tinha toda a legitimidade para agredir o seu adversário. Mais do que isso: tinha legitimidade para agredi-lo e, fosse qual fosse a punição que sofresse, teria de ser menor que a do seu adversário. Lembrando-me de uma situação parecida famosa, num encontro entre o Barcelona e o Athletic de Bilbau, Maradona foi vítima de uma autêntica caça ao homem durante todo o jogo. A caça durou até à altura em que o argentino perdeu a cabeça e respondeu a uma entrada por trás que o poderia ter aleijado gravemente (e ele tinha vindo de uma lesão recentemente) com uma agressão que desencadeou uma batalha campal. De quem foi a culpa daquilo? Dos jogadores do Athletic e do árbitro da partida (ou das próprias leis do jogo, que não protegem quem deviam). A agressão de Maradona, como a de Nasri, é perfeitamente aceitável. E é por isso que não acho que agressões deste tipo (isto é, agressões que sejam consequência ou de outras agressões ou de coisas deste tipo) devam ser punidas do mesmo modo que faltas em jogo. O que estou a dizer pode parecer profundamente radical e ilógico, mas, pensem bem: que razão lógica há para que um jogador mereça a punição de não poder continuar a jogar só porque agrediu alguém que fez algo que poderia ter a consequência de impedir que ele continuasse a jogar? Coisas deste tipo deveriam merecer punições de outro tipo; nunca cartões vermelhos como os que merecem aqueles que motivaram a agressão.

24 comentários:

Unknown disse...

está explicado a tua animosidade contra muitos dos comentadores que têm ideias diferentes. Não sabes o que é viver em sociedade. agredir um adversário revela falta de desportivismo. Comparar entradas irresponsáveis na disputa de bola, com uma agressão e pior que isso a defesa do direito de agredir, mostra o teu carácter. Que defendas que as entradas perigosas devem ter punições exemplares para que os jogadores sejam dissuadidos desse tipo de comportamento é uma coisa, fazer a apologia do direito à agressão é outra completamente diferente.

Por muito que percebas de futebol, e sem dúvida que o percebes, pelo menos muito mais que eu, és um péssimo exemplo em termos do que deve ser o comportamento dum agente no futebol, aliás és um péssimo exemplo como pessoa.

Mike Portugal disse...

Não concordo com a tua conclusão.
Quem está lá para decidir se uma entrada é grave o suficiente para merecer expulsão é o árbitro e não o jogador, senão tinhamos 22 árbitros em campo.

Não podemos começar a deixar que os jogadores decidam por eles, as respostas ás entradas dos adversários. Além de que está na lei de jogo que as entradas por trás merecem cartão vermelho. Outra coisa é os árbitros não os mostrarem, mas isso é por falta de espinha.

Queres uma lei ainda mais estúpida?
Mostrar amarelo ao jogador quando ele tira a camisola após marcar um golo.

Nuno disse...

Bcool, muito obrigado. Deixa-me agora retribuir os elogios. Tu também não és propriamente um bom exemplo de como se deve ler um texto. Repara, ninguém fez uma "apologia do direito da agressão". Nem sequer disse que estas agressões não devam merecer punição. O que fiz foi uma coisa mais complicada, que foi tentar distinguir tipos de agressão e tipos de punição. E só te parece muito exótico porque é quase unânime na sociedade em geral, e no futebol em particular, que "agredir um adversário revela falta de desportivismo".

O que pedi foi aos leitores que pensassem, que respondessem às questões que pus. Tu continuas a achar que agressão é mais grave do que uma entrada violenta, mas não me deste nenhuma razão para tal. Explica-me por que é que achas isso. Quer dizer, eu sei por que é que o achas: vives numa sociedade que o acha, e nem nunca pensaste que é a sociedade que, neste aspecto, pode estar errada.

Outro problema é conseguires extrapolar daquilo que eu penso acerca de agressões de jogadores que foram alvos de entradas violentas o meu carácter. Também aí não me parece que sejas um bom exemplo. Quem te ouvir, parece que eu disse que qualquer transeunte pode agredir outro só porque o abalroou quando se cruzaram. Estou a falar de um contexto muito específico, de um jogo de futebol, e de acções muito específicas, entradas que põem em causa a integridade física de alguém. Repara que eu não defendi, em momento algum (até disse o contrário) que um jogador deve poder agredir outro se o outro o agredir a ele. Não é a mesma coisa. O que eu disse (ou tentei dizer) foi que 1) agredir alguém gratuitamente, 2) agredir alguém em resposta a uma agressão, ou 3) uma entrada violenta são coisas muito diferentes de 4) agredir alguém intempestivamente após ter sofrido uma entrada que o podia ter aleijado. São coisas diferentes, mas, na lei, todas elas são punidas com cartão vermelho (e dão todas mais ou menos o mesmo número de jogos de castigo). Com a agravante de que a 1), a 2) e a 4) são coisas fáceis de analisar, e geralmente dão expulsão, ao passo que a 3) só dá em 5% dos casos. O que fiz foi apontar para uma discrepância entre acções em campo e respectivas punições, dizendo que coisas diferentes merecem punições diferentes.

Quanto à ideia de que agredir é falta de desportivismo, uma vez mais o problema são as generalizações. Um beliscão é agressão? Um dedo no rabo é agressão? Provocação verbal é agressão? E, no entanto, qualquer uma destas coisas revela mais falta de desportivismo do que alguém que perde momentaneamente a cabeça porque sentiu que foi por um triz que não sofreu uma lesão grave. Há um lado irreflectido no último caso que não há nos actos deliberados dos primeiros, e isso faz toda a diferença. É um acto irreflectido que se justifica pela entrada que sofreu. O que é que justifica provocações, agressões gratuitas, etc.? Tu achas que alguém que, como o Nasri, se vira para o outro para o agredir é alguém que o fará necessariamente fora do contexto de um jogo. E esse é o teu erro. O teu e o de toda a gente que acha que aquilo é um acto de falta de desportivismo. Eu conheço muita gente que já fez o que o Nasri fez e que, fora do contexto de um jogo de futebol, nunca teve vontade de agredir ninguém. É o contexto que justifica a acção. Atenção: justifica, não desculpa.

Nuno disse...

O que disse em todo o texto foi que, ao contrário de uma entrada violenta, uma agressão como reacção a uma entrada violenta é justificada. Como é justificada, deve ser punida de maneira diferente. O problema é muita gente achar que a disputa de uma bola justifica também as entradas violentas. Esse é que é o grande problema. É por verem as coisas desse modo, por acharem que enquanto houver uma bola a ser disputada, um jogador pode cometer excessos, mas que, quando não houver, se deve controlar, que acham depois que entradas violentas são mais justificadas do que agressões. Pois eu penso o contrário. Penso o contrário porque, para mim, é mais grave não perceber que pode aleijar gravemente um adversário, ou não se importar com isso, do que agredir quem não o percebeu ou não se importou com isso.

De resto, quanto a punições posteriores ao jogo, ou seja, quanto ao número de jogos de castigo, penso mais ou menos o mesmo. Para mim, entradas violentas deveriam merecer o dobro ou o triplo de número de jogos de castigo do que agressões normais.

Nuno disse...

Mike Portugal diz: "Quem está lá para decidir se uma entrada é grave o suficiente para merecer expulsão é o árbitro e não o jogador, senão tinhamos 22 árbitros em campo."

Sim, porque os árbitros raramente falham. Em Inglaterra, então, os árbitros até têm o hábito de expulsar 6 ou 7 jogadores por jogo, como devia ser. Mike, estes são lances em que a bola está lá, em que a intenção do jogador passa sobretudo por jogar a bola, e lances em que aquele que sofre a entrada sabe que, em 99% dos casos, não vai haver expulsão. Mas, mesmo que haja. O problema não é apenas o facto de o jogador que sofre a entrada achar que quem a cometeu deve ser expulso. Nenhuma expulsão compensa 6 meses de hospital. É isso que as pessoas não compreendem. Quem reage assim não reage apenas porque sabe que aquele que cometeu a entrada vai ficar impune. Reage assim porque sabe que nenhuma punição compensaria a lesão que por pouco não contraiu. É uma reacção não à impunidade do adversário, mas à sua estupidez. E é isso que a tornar justificada.

"Não podemos começar a deixar que os jogadores decidam por eles, as respostas ás entradas dos adversários."

Mas isto não é uma questão de decisão. O árbitro faz o papel dele. Há um exemplo de um desporto em que as lutas fazem parte do jogo, que sempre achei um bocado estúpido. O exemplo não é feliz, mas apenas porque aquilo que é permitido, nesses casos, extravasa o que estou aqui a sugerir. Na verdade, as lutas no Hóquei no Gelo fazem parte do espectáculo, e não é isso que defendo. Mas muitas dessas lutas começam por reacções de jogadores que sofrem entradas que consideram mais violentas. E a luta, embora tenha penalizações, não é entendida como "falta de desportivismo". Faz parte. O que estou a sugerir não é que as lutas passem a fazer parte do jogo, mas algo bastante menos radical. O que estou a sugerir é que agressões em resposta a entradas violentas passem a fazer parte do jogo. Claro que, quando falo de agressões neste contexto, falo de coisas que se vêem a toda a hora, como empurrões, pontapés quando se vai a cair, encostos de cabeça, coisas que não fazem mal a ninguém. Não estou a sugerir que um jogador possa saltar para cima do outro ao murro, nem que possa fazer o que lhe der na real gana. Agora, há uma diferença clara entre reagir espontaneamente a entradas violentas e agredir ferozmente um adversário, seja por que razão for. E, no entanto, esta diferença não está comtemplada nas leis. É contra isso que estou.

"Queres uma lei ainda mais estúpida?
Mostrar amarelo ao jogador quando ele tira a camisola após marcar um golo."

Mike, esse é um exemplo extraordinário. Por que é que isso é ridículo e o que estou a dizer não? Tirar a camisola resulta de um acto de euforia, de um momento em que um jogador, por razões diferentes, é certo, perde a cabeça e faz algo que não faria se não tivesse as emoções que tem naquele momento. É exactamente o mesmo caso. Eu também acho ridículo que tirar a camisola para festejar um golo mereça punição. Precisamente porque são momentos especiais, momentos em que os jogadores têm as emoções à flor da pele. Ora, um jogador normal, um jogador que não anda pelo campo a agredir a torto e a direito, e que só tem vontade de agredir o adversário neste caso, está exactamente na mesma posição de alguém que marca um golo e tira a camisola. E o meu critério é aquele pelo qual te preparas para rebater isto: o de não haver consequências. É que, tal como tirar a camisola não tem consequências más para ninguém, agredir (do modo como estou a sugerir) também não tem consequências para ninguém.

Unknown disse...

"Repara que eu não defendi, em momento algum (até disse o contrário) que um jogador deve poder agredir outro se o outro o agredir a ele."

De certeza ? Fui eu que li mal ?

"Nasri - deixem-me dizê-lo - tinha toda a legitimidade para agredir o seu adversário."

Eu não discuti as sanções, discuti que Nasri tivesse legitimidade para agredir. Não tem, nem ninguém tem. Pode-se tentar compreender os motivos da reacção mas não se pode deixar passar impune.

E os meus comentários foram sobre quem defende que haja legitimidade para agredir.

Se de facto, não defendes o direito à agressão, como resposta a entradas perigosas, então a minha apreciação não tem sentido, mas não foi isso que escreveste.

Mais ainda, se o árbitro considerar a entrada uma agressão, o que não foi o caso, então a resposta a uma agressão, tem sempre, ou pelo menos tinha antigamente uma punição menor que a da agressão, pois hoje em dia já vi cartões vermelhos a serem punidos com um único jogo de suspensão, mas cá no burgo todos os atropelos ao espírito da lei são feitos por quem a aplica e mesmo por quem as faz.

Podes discutir se em termos processuais deve ser levado em conta por quem decide processos disciplinares se o acto anterior e se a reacção intempestiva é uma atenuante.

Mas aí estás a baralhar as coisas, uma coisa é o árbitro aplicar punições e outra são os castigos que daí derivam, o árbitro executa o poder disciplinar dentro de campo, não decide os jogos de castigo.

E não, já pensei nesse assunto e não me interessa o que a sociedade pensa, acho que as pessoas, os jogadores devem ser exemplos e como exemplos que são para os jovens e para o resto da sociedade em geral têm obrigações que um não-profissional não tem. É também por isso que são principescamente remunerados.

E sim, mesmo perder a cabeça e agredir alguém é falta de desportivismo, por muitas atenuantes que tenha. Lê o exemplo do que dizia o José Águas sobre a única vez que tinha sido expulso e prejudicado a equipa. Percebeu o mal que fez, e como tal a partir daí passou a aceitar todas as provocações, agressões, cacetadas e tudo o mais.

Mas lá está, outros tempos, outros valores. Eu é que se calhar estou mais longe do que a sociedade pensa do que tu.

Nuno disse...

Bcool, de facto, é muito difícil explicar certas coisas a quem não sabe ler.

"Se de facto, não defendes o direito à agressão, como resposta a entradas perigosas, então a minha apreciação não tem sentido, mas não foi isso que escreveste."

O que eu não defendo é a legitimidade de agredir por si mesma. Disse-te várias vezes que estou a distinguir tipos de agressão. E, de entre elas, acho que um jogador que responde intempestivamente a uma entrada violenta com uma agressão tem legitimidade para o fazer. Quanto a outros tipos de agressão, não tem. Só isto.

"Mais ainda, se o árbitro considerar a entrada uma agressão, o que não foi o caso, então a resposta a uma agressão, tem sempre, ou pelo menos tinha antigamente uma punição menor que a da agressão"

O que é que interessa os jogos seguintes, se, para os efeitos deste jogo, o jogador (e a equipa( que sofre a entrada violenta é tão punido quanto o jogador (e a equipa) que a comete? Mas, repara, eu não estou a falar de responder a agressões. Estou a falar de responder a entradas que põem em causa a integridade física de alguém. Maior parte das agressões não põem em causa integridades físicas nenhumas.

"Mas aí estás a baralhar as coisas, uma coisa é o árbitro aplicar punições e outra são os castigos que daí derivam, o árbitro executa o poder disciplinar dentro de campo, não decide os jogos de castigo."

Pois, eu estou a falar apenas dentro de campo. E, dentro de campo, este tipo de agressão não deve ser punido. Ou melhor, não deve ser punido da mesma forma que as faltas são punidas. São coisas diferentes, motivadas por coisas diferentes, e com consequências diferentes.

"E não, já pensei nesse assunto e não me interessa o que a sociedade pensa, acho que as pessoas, os jogadores devem ser exemplos e como exemplos que são para os jovens e para o resto da sociedade em geral têm obrigações que um não-profissional não tem. É também por isso que são principescamente remunerados."

Isto é para rir? São bem pagos para serem bem-comportadinhos e para ensinarem os jovens através dos seus exemplos? Que tacanhice é esta? Mas eles são futebolistas ou padres? São pagos assim porque são melhores, em termos gerais, do que quem não faz aquilo. São bem pagos porque são eles que alimentam um espectáculo para o qual há muita gente disposta a pagar. E, francamente, os jogadores de futebol bem pagos são uma esmagadora minoria. Os jogadores não têm de ser exemplos morais de nada; têm de ser jogadores de futebol. Quem não aparece na televisão é que gosta de pensar que quem aparece tem um dever cívico e social diferente dos demais. Isso é absurdo. Eles são profissionais como outros quaisquer, e os deveres que têm são os deveres conformes à profissão deles. Por que é que um futebolista tem de ser um exemplo para alguém e um sucateiro não? Mas, mesmo a questão moral é engraçada. É que tu estás a pensar de um determinado ponto de vista: estás a imaginar que não agredir é um bom exemplo e agredir é um mau exemplo. Eu estou a pensar de um ponto de vista diferente, embora também envolva considerações morais: para mim, uma entrada violenta num lance é um acto muito mais cobarde do que reagir a isso com uma agressão. Do meu ponto de vista, quem agride não está, ao contrário de quem entrou violentamente, a dar um exemplo de cobardia. Moralmente, é um exemplo melhor.

"Mas lá está, outros tempos, outros valores. Eu é que se calhar estou mais longe do que a sociedade pensa do que tu."

Sim, claro que estás. É de uma radicalidade impressionante achar que as leis são para se cumprir.

Mike Portugal disse...

"agredir (do modo como estou a sugerir) também não tem consequências para ninguém."

Tem sim, aí é que te enganas. Eu ando nas artes marciais e posso, com um toque que aparentemente não faz nada de especial, pôr alguém KO. Lá está, não ando ao murro e pontapé com ninguém, logo nunca seria expulso.

O problema que vejo no teu raciocinio é que estás a querer diferenciar reações com base na sua justificação perante a moral. É obvio que entradas estupidas e violentas que nao são punidas pelo árbitro, deveriam ser alvo de analise e posterior castigo a esse jogador, mas não podes justificar uma resposta com o que sugeres sem esperar que o árbitro não mostre pelo menos um amarelo.

O problema que os árbitros têm para resolver é que este tipo de respostas que tu sugeres são algo que está descrito na lei (tal como as entradas) e são FACILMENTE visiveis e interpretaveis, pelo que o amarelo é 99% das vezes mostrado. As entradas estupidas e que podem meter um jogador no estaleiro, por vezes não têm uma interpretação facil, pois são lances rapidos e o árbitro não tem acesso às imagens.

Só para terminar. Os árbitros em Inglaterra são horriveis. Ponto.

Blessing disse...

A questão é a definição de agressão... E para mim ela existe com e sem bola... E a punição deve ser a mais adequada, por quem a vê e por quem depois aplica o castigo... Essas entradas violentas são nada mais que agressões...
Abraço e boas entradas

Unknown disse...

Depois da tua última resposta Nuno, I rest my case.

Nuno disse...

Mike Portugal diz: "Tem sim, aí é que te enganas. Eu ando nas artes marciais e posso, com um toque que aparentemente não faz nada de especial, pôr alguém KO."

Mike, a esmagadora maioria dos jogadores de futebol não sabem artes marciais, e os que sabem não as usam para agredir ninguém. Se o fizerem, não é bem a mesma coisa do que agredir como estou a dizer. Estou a falar de reacções intempestivas, de empurrões, de estalos, de mãos na cara, de encostos de cabeça, de pontapés em queda, etc. Não estou a falar de golpes premeditados, cirurgicamente aplicados. Isso é muito diferente.

"É obvio que entradas estupidas e violentas que nao são punidas pelo árbitro, deveriam ser alvo de analise e posterior castigo a esse jogador, mas não podes justificar uma resposta com o que sugeres sem esperar que o árbitro não mostre pelo menos um amarelo."

Não estou à espera disso. Estou a dizer que são as leis, e o tipo de moral associado a elas, que estão erradas.

Blessing, para mim, não é só o serem catalogadas como agressão que muda a coisa. É o tipo de lance. Para mim, entradas violentas (ou agressões deste tipo) são piores do que agressões sem bola. Chamar-lhe "agressão" não resolve a coisa.

Bcool diz: "Depois da tua última resposta Nuno, I rest my case."

Bcool, não me parece que tenhas "caso" algum. Um "caso" constrói-se com argumentos. Não foi o que fizeste. Apresentaste meia-dúzia de lugares-comuns, sem outra justificação para eles senão que são o que habitualmente as pessoas costumam alegar. Não é assim que se tem um "caso". Estás longe de poder encerrar o que quer que seja.

Carlos disse...

Este blogue é bom demais para os leitores e comentadores que tem.
Os leitores e comentadores que discordam de algo que está escrito, ou não sabem ler, ou não têm argumentos, ou apenas são otários.

Alguém me arranja uma bicicleta?
Sem pedais não quero.

Batalheiro disse...

Carlos,

"ou SÃO apenas otários" e não "ou apenas são otários."

Nuno,

Acho que o problema está relacionado com a escassez de meios de punição ao dispor do árbitro, pois mesmo um cartão amarelo seria injusto para o Nasri. Deviam ser permitidas expulsões temporárias, ou seja, o carniceiro que ia matando o Nasri via vermelho e o Nasri era expulso durante 5 minutos (ou coisa que o valha) para se acalmar.

Bcool,

Os jogadores de futebol não têm de ser melhores exemplos morais do que eu ou tu. Têm de ser jogadores de futebol.

Nuno disse...

E um onze de 2012?0

Manuel Nascimento disse...

Nuno, boas.

Uma pergunta, que esta coisa do futebol-arte e tal tem-me feito pensar.
O futebol como deve ser jogado, por ser a forma mais lógica e mais inteligente, pode ser considerado uma arte como as outras? Lembro-me da tua comparação do futebol ao xadrez, e consigo perceber também, ao ler o que vais escrevendo, o teu entendimento do conceito de criatividade aplicado ao futebol, que poderá não ser propriamente o conceito mais "geral" se aplicado a outras... artes (?).
Tens algum texto em que fales sobre isto? Qual é que seria a tua opinião sobre o assunto?

Um abraço,

Nuno disse...

Manuel, não sei bem o que pensar em relação a isso. Nem sei se já escrevi alguma coisa concretamente sobre isso.

Há uma diferença grande entre futebol e arte, seja ela qual for, que tem a ver com o facto de o futebol ser um jogo e, como todos os jogos, ser uma coisa que está sujeita a um conjunto de regras. É precisamente por um jogo estar sujeito a um conjunto de regras que acho que há maneiras melhores de jogar jogos do que outras. No caso de uma forma de arte, é diferente. Nenhuma forma de arte está sujeita a regras. Um pintor, por exemplo, tem constrangimentos, é verdade, mas limitam-se ao medium: à tela, às tintas, etc.. Regras propriamente ditas não há.

Agora, onde acho parecenças é precisamente na ideia de criatividade. Isto porque o futebol, pelo grau de complexidade que tem (é o jogo mais complexo que conheço), exige índices de criatividade muito semelhantes àqueles a que, normalmente, estamos habituados em obras de arte.

Abraço!

Schmeichel disse...

Comentário de JQM quando o Nuno Espiríto Santo colocou o Hassan em campo: "um jovem com 1,91, portanto um jogador de grande potencial".

O JQM deve pensar que o Shaq O'Neill, o Hakeem Olajuwon, o David Robinson... todos podiam ter tido uma grande carreira no futebol.

E ganham estes asnos rios de dinheiro para dizer estas baboseiras na TV...

Lupi disse...

Boas. Que tal uma análise da CAN idêntica à do Euro2012?

Joel disse...

Lupi;

Que tal uma análise da CAN idêntica à do Euro2012?

O simples facto da CAN decorrer durante os jogos de equipas tirando atletas que são importantes nas manobras das equipas devia ajudar a compreender que fazer a mesma coisa que no Euro é quase impossível...

Zinedine Zidane disse...

Não tem propriamente a ver com o assunto, mas que opinião têm do Thierry Henry?

Nuno disse...

Lupi, não percebo nada de futebol africano. Seria quase como comentar o mundial de andebol.

Fernando Pessoa, reconheço que o Henry teve três ou quatro épocas de bom nível, no Arsenal, mas nunca foi um jogador que me entusiasmasse. Tinha boas qualidades individuais, bons recursos, mas não era um jogador imaginativo. Desses tempos do Arsenal, aquele de que gostava mesmo era do Bergkamp.

Joel disse...

Pepe em munique

Gonçalo Teixeira disse...

O Matic vai estar nos próximo post dos 6 que mereciam ser 10? :) É uma pequena brincadeira, naturalmente não terá a classe dum Pirlo ou dum Paulo Sousa mas espero um post sobre este jogador no vosso grande blog :)

Nuno disse...

Gonçalo, o Matic está, de facto, a surpreender. Não sei se escreveremos um post só sobre ele, sobretudo porque não temos tido muito tempo para escrever sobre o que quer que seja, mas é um jogador que nos tem entusiasmado, nos últimos tempos. Não é, ainda, em termos posicionais um fora de série, mas tem qualidades com bola muito interessantes.