quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Prémios

Passada esta época festiva, apetece-me falar de treinadores, em particular dos da Primeira Liga, e do seu desempenho.

1. Jesualdo tem tido a vida facilitada. Mérito seu? Não creio. No Porto, o difícil é não parecer bom. Domina o campeonato, mas não parece muito seguro quando tem de substituir as suas pedras bases. Gostei particularmente da forma como arrumou com Leandro Lima. Professor? Um professor deve, em primeiro lugar, ser um educador. Desperdiçar o talento do brasileiro já era absurdo; fazer dele um bode expiatório para se eximir de todas as culpas é mesquinhez. Depois, o conjunto parece só saber jogar de uma forma. Quando tem de se acomodar às diferentes circunstâncias do jogo, não se mostra uma equipa capaz. Merece o prémio "Cá estamos".

2. Camacho tem coisas boas, mais ou menos as mesmas que Scolari. Sabe incentivar os jogadores, sabe seduzir os adeptos, mas não sabe mais nada. O seu prazo de validade já expirou há muito tempo. Dos métodos obsoletos à mania dos dois médios-defensivos que arrumem a casa, demonstra a cada jornada a total falta de evolução das suas ideias. Além de não perceber a importância de um jogador como Nuno Assis, de não ver que Coentrão merecia mais oportunidades, de teimar em Binya, não sabe jogar de outra forma que não no seu 4231. Mais gritante é a forma como interpreta o jogo e as substituições que executa: esteja a perder, esteja a ganhar, é troca por troca. Não arrisca nada e espera sempre pela inspiração dos seus jogadores. Perante um resultado negativo, queixa-se sempre da falta de concretização ou da falta de vontade, mas ainda não percebeu que isso são as únicas coisas que vão bem no reino da Luz. Merece o prémio "Espantalho".

3. Paulo Bento é, confesso, o treinador que mais aprecio neste campeonato, mas tem tido alguns erros comprometedores. O seu punho de ferro já se revelou proveitoso (o último caso, com Liedson, é sintoma disso mesmo, uma vez que o brasileiro parece outro jogador depois da suspensão), mas parece demorar muito a decidir usá-lo. Miguel Veloso merecia, como Liedson, uma repreensão parecida: nos últimos jogos, parece ter-lhe subido à cabeça a forma célere como ganhou projecção no futebol europeu e não rende tanto como deveria, parecendo desconcentrado e pouco humilde. Adrien é bom jogador, mas Paulo Bento, antes de todos os outros, deveria pôr um travão na euforia em volta dele: nas poucas vezes que jogou, Adrien nem esteve ao nível a que se pode exibir. Pereirinha já mostrou que podem contar com ele, mas Paulo Bento continua sem lhe dar uma oportunidade a sério. Da maior parte das vezes, tem coragem para arriscar, mas há outras ocasiões em que se acobarda sem necessidade. Em termos tácticos, o Sporting deste ano, muitas vezes, abre em demasia o losango: resulta daqui um futebol menos elaborado e, consequentemente, menos eficaz. É, para mim, a causa principal do recente insucesso da equipa, assim como o mau sector ofensivo da equipa. Aplausos, contudo, para a aposta incondicional em Rui Patrício e para a forma como defendeu Farnerud, ainda que a melhor forma de fazê-lo fosse pô-lo a jogar. Merece o prémio "Ainda vou lá... tranquilamente".

4. Cajuda é, mais do que competente, um treinador ambicioso. Em equipas ditas pequenas, não se acobarda e não constrói a equipa em função de orçamentos reduzidos. Com os grandes, joga olhos nos olhos. Talvez não faça tantos pontos contra equipas superiores quanto os treinadores ultra-defensivos. Acontece, porém, que só há três equipas grandes em Portugal e quinze pequenas. Gosto de um treinador que jogue sempre da mesma forma, quer seja contra o Porto, quer seja contra o Leiria. A equipa vitoriana joga sempre para a frente, troca bem a bola, está bem organizada e merece ser, para já, a primeira dos pequenos. Merece o prémio "Até de muletas".

5. O Vitória de Setúbal é a grande revelação desta época? Não, para quem conhece Carlos Carvalhal. Os clubes por onde passou beneficiaram sempre muito com a sua presença. Em Setúbal, está a fazer um trabalho impecável, recuperando um dos históricos do futebol português. Com um plantel limitado, tem mantido um nível exibicional regular e muita consistência em termos de resultados, só tendo perdido com o Porto. A falta de criatividade do seu meio-campo é compensada com a excelente e constante movimentação do mesmo. Tacticamente, há poucos treinadores tão evoluídos quanto ele; os métodos são dos mais modernos e dos mais eficazes. É, de todos os treinadores da Liga, aquele a quem auguro a maior ascensão em termos de carreira. Merece o prémio "Bem haja".

6. Manuel Machado é muito apreciado em Portugal. Sou dos que não o fazem. Costumo ignorar por completo os resultados obtidos e tomar atenção apenas à forma de jogar das equipas. Como tal, não posso gostar do futebol das equipas de Manuel Machado. O futebol de Manuel Machado está demasiado preso a conceitos defensivos e as suas equipas raramente comandam os desafios. Apresenta sempre dois médios-defensivos e um meio-campo pouco imaginativo, muito mais trabalhado para recuperar e lançar rapidamente os ataques. Organiza bem a equipa atrás, mas não sabe incutir um espírito ofensivo aos seus jogadores. O óptimo trabalho no Moreirense e os bons resultados com o Guimarães e o Nacional não implica que seja bom. Se em Moreira de Cónegos teve o mérito de subir a equipa por duas vezes seguidas, em Guimarães não fez mais do que lhe competia, levando um plantel de luxo ao 5º lugar. Já na Madeira, ainda que beneficiando de um orçamento chorudo, conseguiu igualmente o 5º lugar, feito um pouco mais que o razoável. Na Académica, acabou por claudicar, ficando à beira da descida e com argumentos para fazer melhor: foi a prova de que, sem um plantel individualmente forte, capaz de suprir ofensivamente as deficiências tácticas do treinador, sem os jogadores com quem andou às costas desde sempre (coisa importantíssima, pois os jogadores, quanto há mais tempo trabalharem com o treinador, melhor sabem respeitar os desígnios dele), não é capaz de oferecer nada. No Braga, não fará, provavelmente, um mau trabalho: a excelência dos elementos ofensivos mascarará a pouca argúcia ofensiva do treinador, enquanto que, defensivamente, saberá impor os seus conhecimentos. Não acredito, contudo, que o Braga dele possa ir mais longe do que foi nos últimos anos; não acredito que consiga o 4º lugar confortavelmente, coisa que, com um plantel daqueles, seria da sua competência. O Braga até pode acabar em 4º, mas duvido que o consiga com tranquilidade. Duvido também que chegue a importunar os três grandes, coisa que, com um plantel como aquele, tinha obrigação de fazer. Não é dos treinadores mais incompetentes em Portugal; é até um bom treinador para uma equipa de segunda linha. Mas para uma equipa ambiciosa como o Braga, não acho que chegue. Merece o prémio "Não sou assim tão bom".

7. Lazaroni é, pelo que foi dado a entender até agora, um treinador de mentalidade ofensiva. O excelente plantel do Marítimo também ajuda, é verdade, mas o facto de não se encolher perante os adversários é, para mim, motivo de apreço. Apesar dos muitos brasileiros do plantel, é nos reforços portugueses que a equipa está a ir buscar a força: Ricardo Esteves, Bruno, Fábio Felício e Makukula têm uma mentalidade europeia que, aliada à irreverência de alguns brasileiros de qualidade, como Marcinho, Kanu e Olberdam, confere competitividade à equipa. Lazaroni não é o típico treinador brasileiro em Portugal; a sua equipa tem mecanismos, não vive só das individualidades. E, para isso, muito tem contribuído a experiência de certos jogadores. Merece o prémio "Muitos brasileiros não".

8. Jorge Jesus tem feito um excelente trabalho no Belenenses. A final da Taça e o 5º lugar da época transacta reflectem isso mesmo. Assenta o seu modelo de jogo num 442 losango, pouco apreciado por quem não percebe muito de futebol, e tenta controlar as operações do princípio ao fim do jogo. Se é verdade que perdeu o defesa Nivaldo e os avançados Dady (a grande revelação da equipa na época anterior) e o panamiano Garcés, tendo que remodelar toda a frente de ataque, conseguiu no entanto o concurso de jogadores de qualidade como Devic, Hugo Alcântara, Gomez, Hugo Leal, Roncatto, Weldon e Mendonça. O plantel é forte e pensado para jogar de forma ofensiva, coisa que a equipa vai fazendo. Na minha opinião, o actual oitavo lugar não é condizente com a qualidade da equipa e com a qualidade do futebol da mesma. Penso que, com um pouco mais de sorte, estaria ligeiramente acima. Acredito, contudo, que terá uma palavra a dizer, no final, na disputa por um lugar europeu. Merece o prémio "Carácter".

9. Jokanovic é ainda novo nestas andanças. Para já, o seu Nacional não parece tão forte quanto o Nacional dos últimos anos. O plantel é bom e o investimento foi forte: alguns jogadores como Fellype Gabriel ou Lipatin têm até classe a mais para uma equipa da segunda metade da tabela. Conta ainda com o melhor guarda-redes da Liga, se exceptuarmos os guarda-redes dos três grandes, e com alguns jogadores de boa categoria. O trabalho tem sido, contudo, extremamente irregular e não se augura muito mais que o 9º lugar que, para já, ocupa. Merece o prémio "Talvez um dia".

10. Ulisses Morais é o típico treinador português ultrapassado. Não será tão parco de ideias como um Mário Reis ou um Luís Campos, mas é um treinador pouco ambicioso. Não conheço a fundo o seu trabalho, mas não costumo gostar do futebol pouco pensado das suas equipas. A Naval deu-se ao luxo de dispensar Francisco Chaló, que tinha posto a equipa a jogar um futebol agradável, e foi buscar um treinador que se baseia na disciplina defensiva, no rigor das marcações, etc. É sintoma de que, para muitos emblemas, o importante é conquistar pontos e não praticar futebol. Esquecem-se, porém, que a melhor forma de adquirir a primeira é fazendo bem a segunda. Merece o prémio "Não me convence".

11. Carlos Brito é um treinador mais moderno. Não lhe apraz apenas a consistência defensiva e parece-me que dá a mesma importância aos processos ofensivos. Não creio que seja treinador para conseguir muito mais do que já conseguiu, para treinar emblemas mais ambiciosos, mas é óptimo para uma equipa da Primeira Liga que não queira apenas a permanência. Colocá-lo-ia ao nível de Manuel Machado, com a diferença de que para Brito o futebol não é só organização defensiva. É um treinador competente e não vejo o Leixões, ainda que com um plantel modesto, a ter problemas para permanecer entre os grandes. Merece o prémio "Consistência".

12. Quando Domingos Paciência apareceu a treinar o Leiria, gostei do que vi. Pareceu-me ser tão inteligente enquanto treinador quanto o foi enquanto jogador. Gostei da forma desinibida da sua equipa actuar e era dos treinadores que mais apreciava a época passada. Talvez vítima da pouca qualidade dos treinadores da Liga, julgo ter sobrestimado o valor de Domingos. Saiu de Leiria por questões não-desportivas e chegou à Académica para dar nova alma à briosa. Não duvidei, na altura, que fosse suficientemente competente para o fazer. O plantel dos estudantes não é propriamente forte, por isso não esperei que conseguisse ser bem sucedido de imediato. Esperava, no entanto, que emprestasse ao jogo da equipa uma mentalidade mais forte. A Académica que vi jogar esta época é uma equipa amedrontada, que só sai para o ataque uma ou outra vez em cada 45 minutos. Como agravante, Hélder Barbosa, o mais talentoso jogador do plantel, nem sequer foi opção durante grande parte do tempo. Domingos não confiou nos modelos que usou em Leiria e preferiu sempre um meio-campo musculado e experiente, deixando de fora a imaginação e a fantasia. Merece o prémio "Judas".

13. Daúto Faquirá é dos treinadores mais bem-educados da Liga. Moderado nos comentários, comedido e ponderado, revela uma inteligência e uma forma de estar no futebol diferente do que é habitual. É uma pessoa culta e com mais instrução do que maior parte dos treinadores portugueses. Essas virtudes têm valido ao Estrela uma regularidade impressionante. Aposta num 442 losango, sobretudo a pensar na ocupação da zona central do terreno. O Estrela de Faquirá é uma equipa sempre bem organizada em campo, mas à qual falta muitíssima imaginação. Vive de lances de bola parada ou do desembaraço individual de alguns dos seus jogadores. Para uma equipa pequena, cujo único interesse seja a permanência, Faquirá é bom. Para mais do que isso, até ver, não creio. Merece o prémio "Elegância".

14. Jaime Pacheco não tem sequer qualidade para treinar nas distritais. A sua mentalidade tacanha, a insolência com que fala e pensa perceber de futebol chegam a ser patéticas. Ainda não compreendeu que o futebol é um desporto de zonas e que defender homem a homem é das coisas mais estúpidas que pode haver. Ainda não percebeu que uma equipa que jogue em função do adversário não pode nunca ser uma equipa ambiciosa. Ainda não percebeu que a entrega, que o suor, que o esforço não são mais importantes que a qualidade e que a inteligência. Ainda não percebeu que foi campeão porque calhou. Ainda não percebeu que não tem neurónios para exercer um cargo que exija pensar. Ainda não percebeu que está a mais no futebol. E continua a mandar bitaites, a insinuar que é bom, a comparar-se a Mourinho, etc. Merece o prémio "O Futebol estava bem melhor sem mim".

15. José Mota é, a par de Pacheco, o pior treinador desta Liga. O Paços de Ferreira é uma equipa que aposta nos erros dos adversários. Fecha-se o mais possível atrás, com três médios de características unicamente defensivas, e lança três jogadores rápidos na frente. Dá a iniciativa do jogo ao adversário e tenta explorar os espaços que, depois, este concede. O problema de uma estratégia assim é que está sempre dependente de duas coisas: dos erros dos adversários e da inspiração dos jogadores da frente. Ou seja, colectivamente, a equipa é nula. Tanto pode conseguir uma boa época, como o ano passado, como pode descer de divisão, cenário plausível esta temporada. Com um plantel praticamente igual ao do ano anterior, não se explica tamanha diferença nos resultados. Queixam-se, aqueles que defendem a qualidade de José Mota, que o plantel sofreu duros golpes. Assim não é. Sairam Antunes e Geraldo, titulares indiscutíveis da defesa, é verdade. Também sairam Ronny e João Paulo, dois dos avançados mais utilizados. Mas a equipa tem alternativas válidas. Já no meio-campo, as saídas de Elias e Paulo Sousa foram colmatadas com entradas importantes de Filipe Anunciação e Wesley. O plantel não está, ao contrário do que foi dito, mais fraco. Nem sequer mudou significativamente. Dos onze titulares da época passada, pelo menos 6 mantiveram-se. Não há que encontrar explicações onde elas não existem: o futebol de José Mota tanto pode dar para ir à UEFA como para descer de divisão. Merece o prémio "Eu não sei o que faço".

16. Vítor Oliveira chegou a Leiria numa má altura. Não lhe reconheço qualidades extraordinárias nem sequer estou a par, em rigor, dos seus anteriores trabalhos. Do pouco que conheço, considero-o um homem com alguma experiência, mas que evoluiu pouco em termos de métodos e de mentalidade. Não é treinador para equipas com ambições, mas talvez seja treinador para equipas em apuros. A ver vamos como o Leiria se porta com ele. Merece o prémio "Nem ai nem ui".

Feita esta análise, devo dizer que tenho saudades de Quinito, Peseiro, Vítor Pontes, Co Adriaanse, etc. Seria tudo muito mais interessante se alguns destes estivessem nos lugares de outros como José Mota, Jaime Pacheco ou Ulisses Morais. Mas assim não é e é este o futebol que temos...

1 comentário:

zorg disse...

Hilariante! Parabéns!