sábado, 16 de junho de 2012

Euro 2012 - 2ª Ronda

Grupo A

Confirmaram-se as impressões da primeira ronda, com a Rússia a ter muito maiores dificuldades contra uma equipa que jogou quase sempre atrás da linha da bola, e com a República Checa a mostrar credenciais. Jogo horripilante da Grécia de Fernando Santos. Se, no primeiro desafio, os gregos ainda tinham mostrado algumas ideias, neste segundo jogo, a colocação de Samaras no eixo do ataque abriu espaço para uma constante e pouco criteriosa solicitição do avançado. Já a República Checa fez uma primeira parte extraordinária, do melhor que já se viu neste europeu. A pouca qualidade individual dos checos atraiçoá-los-á, como já os atraiçoara na primeira partida, mas tirando a Espanha, que é de outro campeonato, os checos são talvez aqueles que praticam o melhor futebol deste torneio. Combinações ofensivas excelentes, trocas curtas e rápidas da bola, muitíssimo bem Milan Baros nos movimentos de apoio e na forma como se relaciona com os colegas. Na segunda parte, mais desgastados e sem Rosicky, os checos confiaram na vantagem que tinham e não procuraram com a mesma insistência e qualidade a baliza adversária, mas a primeira parte foi de luxo. No outro jogo, os polacos puseram a nu as debilidades que me parecia haver na selecção russa. Kerzhakov tem movimentações de ruptura excelentes, mas já se percebeu que só sabe procurar a profundidade. Sem critério, sem capacidade para modificar o seu comportamento, o avançado russo torna-se previsível. E não ajuda a que a Rússia consiga ter maior qualidade em posse. Arshavin e, principalmente, Dzagoev, não conseguiram invadir os espaços interiores tão bem como o tinham feito no primeiro jogo, e disso se ressentiu também a selecção russa. Na verdade, não o conseguiram porque a Rússia não soube criar os espaços para que eles conseguissem invadi-los, e foi essa a crítica que lhes fiz no primeiro jogo. É que, em transição, e com equipas que se posicionam mal no momento da perda da bola, é fácil invadir esses espaços. Em organização é que é complicado. E os russos, ainda que bem organizados, uma vez mais, mostraram pouca imaginação para criar esses espaços. Ou seja, com bola, a Rússia nunca conseguiu fazer o que me parece mais importante uma equipa fazer com bola: atrair o adversário para certas zonas de modo a desimpedir outras, provocar zonas de pressão ilusórias para abrir buracos em zonas preferenciais. Sem essa capacidade, a Rússia só conseguiu acercar-se da baliza adversária em ataques rápidos, em solicitações compridas, e em erros do adversário. Mandou mais no jogo do que na primeira partida, mas acabou por ser incapaz de controlar a partida frente a um adversário tão débil como a Polónia. Quanto aos polacos, não são, individualmente, tão fracos como noutras alturas. Os três jogadores do Dortmund e Obraniak têm qualidade, e conseguem incomodar os adversários. Mas colectivamente a equipa não é extraordinária. Até podem conseguir vencer os checos, nem que seja pela motivação extra, até agora bastante relevante, de jogarem em casa, mas a minha previsão é a de que acabem eliminados.

Grupo B

Portugal venceu a Dinamarca, mas não convenceu. Não convenceu não porque não tivesse merecido (apesar de tudo, acho que a vitória é justa), mas porque não soube, sobretudo estando a vencer por dois golos, controlar a partida. Os dinamarqueses voltaram a mostrar muita qualidade com bola, e muita paciência na gestão da partida. Mesmo a perder por dois golos, não procuraram o que seria mais fácil, que era um futebol mais directo, a impor o físico. Tentaram atrair a pressão portuguesa para onde lhes convinha, normalmente o flanco esquerdo, e saíram muitas vezes dessa zona a solicitar o flanco contrário, com o lateral direito a aparecer para cruzar. Muito sinceramente, não consigo aceitar nem as críticas a Ronaldo, cujo posicionamento aberto e profundo foi claramente estratégico, nem as críticas a Fábio Coentrão ou a Miguel Veloso. Há mérito dinamarquês na forma como conseguiram criar sistematicamente espaço no lado direito, e, a haver demérito português, há-o colectivamente. Depois, estrategicamente, Portugal não fez um bom jogo. A Dinamarca gere bem a posse de bola, e controla bem o ritmo de jogo. É uma selecção que privilegia os momentos de organização, e o recuo estratégico dos portugueses só os beneficiou. A intenção era surpreender o adversário numa transição, eu sei, mas nem isso foi bem pensado. A Dinamarca ataca de forma cautelosa e muito bem organizada. Este tipo de predilecção faz com que percam muito menos vezes a bola, o que faz com que se sujeitem muito menos vezes a transições, e faz com que não sejam frágeis ao perder a bola. Era com bola que Portugal deveria ter jogado. Se a circulasse, obrigaria os dinamarqueses a pressionar mais alto e a momentos de maior desorganização. Não o fazendo, sujeitou-se àquilo em que eles são melhores, e o empate chegou muito naturalmente. Um golpe de sorte salvou Portugal, não obstante o facto de a partida poder ter sido sentenciada muito antes, mas a verdade é que Paulo Bento e os seus pupilos puseram-se a jeito. Tornou-se consensual de que, a ganhar, uma equipa faz bem em permanecer recuada e em apostar nos momentos de transição. Mas isso é estúpido, principalmente contra selecções que estão preparadas para isso. Enquanto Portugal quis mandar no jogo, foi superior e marcou dois golos. A partir do momento em que abdicou da iniciativa, perdeu o controlo da partida. Nota de destaque, ainda, para Cristiano Ronaldo e Hélder Postiga. Não sei se é legítimo que uma nação que assobia um jogador festeje um golo marcado por ele, nem sei se é legítimo que um país que mima tanto um jogador o assobie por falhar dois golos. A maioria dos que têm opiniões fortes sobre estes dois deviam ter ficado indiferentes às duas situações. Era, pelo menos, a única reacção coerente. Mas este é talvez um bom jogo para que se perceba que os patinhos feios talvez não sejam tão feios como os pintam, e que os super-hérois talvez não sejam tão heróicos como também muitas vezes os consideram. A verdade é que o melhor do mundo e arredores pecou onde - dizem os sábios e os adivinhos - o outro costuma pecar. Foi uma boa demonstração de como as certezas das pessoas estão tão certas como as previsões de um bruxo. E, tal como não acho que Postiga é o perdulário que dizem ser, além de merecer ser avaliado por outras coisas, acho a crucifixação de Ronaldo, apenas por ter feito um mau jogo, um absoluto disparate. Ronaldo marca muitos golos porque é fortíssimo a aparecer em zonas de finalização, não por ter uma especial aptidão para marcá-los. E nisso, Ronaldo foi o que costuma ser: as desmarcações foram perfeitas; o que falhou foi o momento de finalização. Mas esse momento é um pormenor que depende de muitas coisas, e é até absolutamente falso que Ronaldo seja exímio nesse momento. Quanto ao jogo que opôs a Holanda à Alemanha, não tenho muito para dizer. A Holanda - e o seu treinador - é uma equipa tão fraca (enquanto colectivo) que chega a aleijar. Aquilo são onze individualidades, cada uma com capacidades extraordinárias, que não conseguem relacionar-se entre si. Se o futebol fosse uma corrida de estafetas, a Holanda era das melhores equipas do torneio. Como não é, é das piores. Do outro lado, a Alemanha parece nem se ter esforçado muito. Sempre muito organizada, quer a defender, quer a atacar, parece ter jogado apenas quanto bastava. Aliás, acho que a Alemanha ainda não mostrou, porque ainda não foi obrigada a isso, toda a sua competência. Talvez o faça contra a Dinamarca, que, dos três adversários do grupo, é.a equipa colectivamente mais interessante.

Grupo C

 A primeira pergunta é: quem é o Iovinco? Luís Freitas Lobo conhece muitos jogadores, eu sei, mas na Itália não joga nenhum Iovinco, tanto quanto eu saiba. Joga um Giovinco, que até devia jogar de início, mas não deve ser o mesmo, porque Freitas Lobo também disse que o rapaz tinha menos de 1,60m. Disparates à parte, como antevi, a Itália teve mais dificuldades em impor-se contra um adversário mais fraco. Prandelli manteve a estrutura, e gosto bastante da forma como os italianos constroem o início das suas jogadas, sem pressa nenhuma. O problema está, acima de tudo, na ligação do meio-campo com o ataque. Thiago Motta tem movimentos verticais interessantes, mas não é um jogador que saiba o que fazer à bola quando o jogo exige maior criatividade. Montolivo, sim, sabe-o, e devia ser nele que Prandelli devia apostar. A Itália, também pelo próprio sistema táctico, coloca poucos jogadores entre linhas, e precisava de que os médios, Marchisio e Thiago Motta (ou Montolivo), e um dos avançados, Cassano (para mim, Giovinco), jogassem mais sem bola, procurando espaços de recepção em zonas interiores. A verdade é que a Itália parece conseguir criar espaços na profundidade e pelos flancos, mas não os consegue criar pelo meio, e isso é problemático. À margem de tudo isto, enorme o europeu de Andrea Pirlo, até agora. É o melhor, na posição de médio-defensivo, desde Fernando Redondo. Quanto à Espanha, foi o que se esperava. A Irlanda é demasiado fraca para estas andanças, e levou 4 como podia ter levado 10. Shay Given foi o melhor em campo, do lado dos irlandeses. Um adversário tão fraco, ao nível do posicionamento colectivo, e ao nível da decisão com bola, até deve ser aborrecido, para os espanhóis. Jogo sem grande história, com Vicente del Bosque a fazer a vontade aos críticos, abandonando a ideia de jogar sem um jogador com características de avançado. Não é necessariamente mau, mas mostra poucas convicções. Se estivesse convicto de que, pelo modo como estes jogadores jogam, era mais importante ter 3 atacantes que privilegiam movimentos de aproximação e não de ruptura, devia ter continuado a apostar em Fabregas. O que revela o treinador espanhol é que não está certo de saber o que é este tipo de jogo. Fernando Torres, enquanto avançado, oferece à Espanha certos movimentos que Fabregas não oferecia, sim, mas faz com que esses movimentos de ruptura, que antes eram quase aleatórios, podendo surgir na pessoa de Fabregas, de Iniesta, de Silva, ou de Xavi, sejam agora quase que exclusivamente protagonizados pelo avançado do Chelsea. Com avançado, a Espanha até pode criar mais situações de golo, mas é menos imprevisível e, sobretudo, não cria tão boas situações de golo.

Grupo D

Mais dois jogos fracos, neste grupo, com os principais candidatos a mostrarem-se incapazes de encantar. Vale à França e à Inglaterra a terrível ingenuidade quer dos ucranianos, quer dos suecos. Rooney até pode começar o Euro a partir de agora, mas a verdade é que a equipa inglesa precisava de muito mais do que alguém como ele. Estão em boa posição para seguir em frente, bastando-lhe o empate contra a Ucrânia, mas ainda não vi uma única jogada interessante protagonizada pela equipa inglesa. Contra a Suécia, nem sequer soube manter a vantagem inicialmente adquirida. Quanto aos suecos, contar apenas com Ibrahimovic é pouco, muito pouco. É pena que ele, um dos melhores avançados, se calhar de todos os tempos, não tenha a possibilidade de representar uma selecção mais competitiva. Quanto à França, Laurent Blanc modificou o sistema táctico, passando a actuar apenas com dois médios. Em termos práticos, porém, o 4231 não foi excepcionalmente diferente. Os franceses continuaram pouco ligados, com Ribery a querer resolver tudo sozinho. Um apontamento para Benzema, que é um avançado fenomenal. No Real Madrid, não sendo a figura máxima da equipa, tem tendência a procurar combinações com os restantes companheiros de ataque. Na selecção, contudo, fá-lo bem menos. Talvez por se sentir mais influente, talvez por lhe ser pedido que seja mais individualista, Benzema remata de tudo o que é sítio, procura ser ele a criar e a concluir, e é muito menos jogador. A França não deslumbrou, e houve até momentos no jogo em que deu a sensação de que eram os ucranianos quem estavam mais perto de inaugurar o marcador. Depois, quase caídos do céu, a França marcou dois golos e resolveu a partida. Acontece muitas vezes, e continuará a acontecer. O primeiro adversário a sério da França aparecerá ao quarto jogo, seja ele a Espanha, a Itália, ou a Croácia, e aí se verá a que pode verdadeiramente aspirar esta equipa.   

9 comentários:

Miguel Nunes disse...

N concordamos c algumas coisas,mas já falamos disso. Acabei de ver o jogo da Itália agora e vim só comentar não só o Iovinco, mas o q o FL disse dele "C outro fisico e outro nome seria um grande jogador na Europa.

Tipo, se fores pequeno só dá se te chamares Iniesta ou Xavi? LOL

Mike Portugal disse...

"Este tipo de predilecção faz com que percam muito menos vezes a bola, o que faz com que se sujeitem muito menos vezes a transições, e faz com que não sejam frágeis ao perder a bola."

Discordo de ti aqui. A Dinamarca fartou-se de perder bolas e ficaram muitas vezes sujeitos às transições perigosas do Ronaldo. Alias 90% das jogadas de Portugal passaram por Ronaldo de alguma forma.

O nosso problema é que não aproveitamos (com boas decisões) nenhuma delas. O nosso problema neste jogo esteve precisamente nas decisões tomadas em transição que foram muito fracas, como o PB já mostrou no post que fez com imagens.

Nuno disse...

Nuno, que opinião tens do Ottmar Hitzfeld?

Manuel Nascimento disse...

Lembrei-me agora da tua (para mim) célebre frase do "Eu tenho esta mania parva de achar que futebol não é tiro ao prato." ao ler este excerto da entrevista do Jesus ao Record:

"Cardozo é golo, não lhe peçam para jogar bem. E mesmo assim ele às vezes joga bem e faz golos. Para nós, treinadores, fazer golos já é jogar bem."

Ou alguém não gosta dele lá no Record e alterou a citação, ou então Jorge Jesus pôs-se a jeito de uma forma que eu não esperava.

Ricardo Faria disse...

Nuno, tens uma concepção bastante específica do jogo, da qual não abdicas - atenção, que não estou a dizer que é boa ou má - mas que tem o mérito de não te deixares influenciar minimamente pelos comentadores e pela opinião dominante.

Só te queria dar os parabéns por seres das poucas pessoas em Portugal que se apercebeu da importância do Hélder Postiga no primeiro golo do Ronaldo. É que não vi nenhuma referência ao apoio que permitiu "abrir" o espaço para o CR7 entrar e provavelmente, segundo a imprensa, o Hélder Postiga foi uma nulidade.

Nuno disse...

PB, é verdade. Nunca mais acabam com essa conversa do tamanho.

Mike Portugal diz: "A Dinamarca fartou-se de perder bolas e ficaram muitas vezes sujeitos às transições perigosas do Ronaldo. Alias 90% das jogadas de Portugal passaram por Ronaldo de alguma forma."

Não se fartaram de perder bolas. E raramente as perderam em situações de inferioridade numérica. É esse o ponto. Eu concordo com o PB quando ele diz que os dinamarqueses defendem mal o espaço central e colocam muita gente à frente da linha da bola. Mas é preciso ver isso em contexto. E o contexto é o tipo de jogo que preferem. Eles trocam a bola pacientemente, e levam os adversários para onde querem, para depois invadirem outros espaços. A forma como chegaram ao lado direito para cruzar vezes sem conta tem a ver com isto. Claro que perderam bolas. Toda a gente as perde. Mas quantas vezes é que a perderam estando desequilibrados atrás? Pouquíssimas. O texto do PB refere más decisões nas transições portuguesas, e aí não estou de acordo. Ou melhor, houve más decisões, mas houve sobretudo transições em inferioridade numérica. E, ao contrário do que se pensa, não é por haver mais espaço que é mais fácil decidir. Em lances de transição, porque há mais espaço e menos gente, qualquer milímetro a mais é significativo. Um passe tem de sair muito mais preciso, e toda a decisão implica uma execução exemplar. Acho que Portugal falhou, num lance ou outro na decisão, mas falhou sobretudo por não ter conseguido sair em transições em que fosse mais fácil decidir, que levassem mais gente, e apanhassem os dinamarqueses mal posicionados atrás.

Pinto diz: "Nuno, que opinião tens do Ottmar Hitzfeld?"

Banal.

Manuel Nascimento diz: "Ou alguém não gosta dele lá no Record e alterou a citação, ou então Jorge Jesus pôs-se a jeito de uma forma que eu não esperava."

Pois, o Jesus põe-se muitas vezes a jeito.

Ricardo Faria diz: "Só te queria dar os parabéns por seres das poucas pessoas em Portugal que se apercebeu da importância do Hélder Postiga no primeiro golo do Ronaldo. É que não vi nenhuma referência ao apoio que permitiu "abrir" o espaço para o CR7 entrar e provavelmente, segundo a imprensa, o Hélder Postiga foi uma nulidade."

Ricardo, obrigado. Mas olha que o PB, no Lateral-Esquerdo, escreveu sobre isso. E ele nem gosta particularmente do Postiga. Para mim, o Postiga fez um jogo extraordinário. Com e sem bola. Foi o seu melhor jogo no europeu. A imprensa, e as pessoas em geral, só se lembrarão do lance do golo que falhou, porque só reparam nos lances de golo, e em que faz o passe e em que marca. Não reparam em mais nada. São estúpidos. Nem sequer reparam que, no lance do golo que falhou, o Postiga ficou para trás de propósito (aliás, fez isso mais vezes, ao longo do jogo), para criar a ilusão de que se podia atrasar para o central. Enfim, já estou habituado a que as pessoas não percebam estas coisas. Mas foi um movimento característica, que por acaso deu golo. Ele faz isto constantemente, e devia ser elogiado tanto quando dá golo, como neste caso, como quando não dá. E devia ser elogiado porque isto é a coisa certa a fazer. Ainda por cima quando se joga com o Cristiano Ronaldo, que é provavelmente o melhor extremo do mundo a fazer diagonais nas costas dos avançados.

Ricardo Faria disse...

Sim, eu vi que o PB escreveu sobre isto logo após ter feito este comentário quando fui ao blog dele

Blessing disse...

Desta vez assino e subscrevo por

Blessing disse...

Análise mais uma vez semelhante a minha. Assino e subscrevo. A convicção do Del bosque é controlar o jogo contra selecções mais fortes e dar essa imprevisibilidade na tentativa de surpreender. Contra adversários modestos não existe essa