O mundial está aí à porta e, enquanto uns suam as estopinhas para ganhar a Moçambique, outros fazem os polacos comer pó e vencem-nos por seis golos sem resposta. A selecção espanhola é aquela que me parece, à partida, melhor apetrechada para vencer a competição e aquela cujo futebol mais espanta. Já o era para mim antes do Euro 2008 (prova que veio a vencer), apesar de o modelo de jogo e o trabalho técnico em torno do colectivo ter sido francamente pobre, e a substituição de Luis Aragonés por Vicente del Bosque no cargo de seleccionador só veio reforçar essa opinião. Depois de uma qualificação brilhante, só com vitórias, os espanhóis partem agora para o mundial no grupo dos maiores favoritos. Nunca antes a expectativa em torno de nuestros hermanos fora tão alta.
A jogada é a do segundo golo da Espanha frente à Polónia e, além de mostrar como o futebol, quando jogado de modo colectivo, pode ser extraordinário, é uma imagem de marca desta selecção, à qual Xavi, Iniesta, Fabregas e Silva, principalmente, forçam o seu estilo. O futebol rendilhado, de toque curto, dos espanhóis, a privilegiar os espaços centrais para penetrar nas linhas adversárias, teve neste lance a perfeição idealizável. O lance começa na esquerda e os polacos não têm propriamente os espaços centrais desprotegidos. Ainda assim, Iniesta conduz a bola para o meio, deixando-a em Xavi, que tabela de imediato com David Silva. Xavi aguenta depois a carga e joga em Iniesta, que se tinha posicionado no espaço entre linhas. Este, embora tenha David Silva a apenas um metro, não hesita em jogar de frente com ele, de primeira, recebendo a devolução de imediato. Iniesta roda, espera que Xavi se desmarque nas costas da defesa e, com um passe açucarado por cima de toda a defensiva, isola o colega de equipa no Barcelona. Isolado e perante a saída do guarda-redes adversário, Xavi não aponta à baliza, optando antes por passar de primeira para David Silva, que fica com a baliza escancarada e só tem de encostar.
Tudo isto, descrito assim, parece simples, mas é preciso notar que ocorre quase tudo num espaço de pouco mais de dez metros quadrados e no meio de sete adversários. Não sei se a dimensão do lance estará a ser bem compreendida. Três jogadores, sem a ajuda de mais ninguém, conseguiram passar pelo meio de sete adversários, num espaço reduzidíssimo, não em força ou em velocidade, mas recorrendo a trocas de bola curtas e rápidas. No total, desde o passe inicial de Iniesta até ao remate de Silva para o fundo da baliza, houve oito trocas de bola. Há quem ache que isto é simples e que o que estes jogadores fazem é simplificar o jogo. Mas isto é precisamente o oposto. O futebol dos espanhóis não podia ser mais complexo e de difícil execução. É por isso que, para jogar assim, é preciso índices de criatividade elevadíssimos em todos os jogadores e uma capacidade de raciocínio muito acima da média. Aqueles toques de primeira parecem fáceis porque a bola percorre poucos metros, mas os requisitos intelectuais para se poder executar um passe daqueles não estão ao alcance de todos. Cada uma daquelas trocas de bola exige mais do que o mais fantástico dos dribles individuais, do que o mais perfeito passe longo. Estes jogadores, antes de receberem a bola, já leram a mente dos colegas e já sabem como estes se vão comportar. Para que o saibam e para que possam tirar partido disso, não precisam apenas de estar à vontade tecnicamente para jogar de primeira; precisam, sobretudo, de ter a capacidade de se colocar no lugar dos outros, isto é, precisam de uma capacidade imaginativa suficientemente ampla para que percebam não só qual a melhor solução para o lance como também de que modo está o colega a pensar. O que esta jogada está, no fundo, a fazer, de um modo bem menos perceptível, é a troçar dos Raúis Meireles da bola. Este é o futebol do futuro e, mais do que isso, o próprio indício de quais serão os mais competentes jogadores do futuro. Haverá poucas lições mais perfeitas que esta e todos os treinadores do mundo deveriam pegar neste lance e mostrá-los aos seus jogadores, dizendo de seguida: "Estão a ver? É assim que se joga futebol!"
A jogada é a do segundo golo da Espanha frente à Polónia e, além de mostrar como o futebol, quando jogado de modo colectivo, pode ser extraordinário, é uma imagem de marca desta selecção, à qual Xavi, Iniesta, Fabregas e Silva, principalmente, forçam o seu estilo. O futebol rendilhado, de toque curto, dos espanhóis, a privilegiar os espaços centrais para penetrar nas linhas adversárias, teve neste lance a perfeição idealizável. O lance começa na esquerda e os polacos não têm propriamente os espaços centrais desprotegidos. Ainda assim, Iniesta conduz a bola para o meio, deixando-a em Xavi, que tabela de imediato com David Silva. Xavi aguenta depois a carga e joga em Iniesta, que se tinha posicionado no espaço entre linhas. Este, embora tenha David Silva a apenas um metro, não hesita em jogar de frente com ele, de primeira, recebendo a devolução de imediato. Iniesta roda, espera que Xavi se desmarque nas costas da defesa e, com um passe açucarado por cima de toda a defensiva, isola o colega de equipa no Barcelona. Isolado e perante a saída do guarda-redes adversário, Xavi não aponta à baliza, optando antes por passar de primeira para David Silva, que fica com a baliza escancarada e só tem de encostar.
Tudo isto, descrito assim, parece simples, mas é preciso notar que ocorre quase tudo num espaço de pouco mais de dez metros quadrados e no meio de sete adversários. Não sei se a dimensão do lance estará a ser bem compreendida. Três jogadores, sem a ajuda de mais ninguém, conseguiram passar pelo meio de sete adversários, num espaço reduzidíssimo, não em força ou em velocidade, mas recorrendo a trocas de bola curtas e rápidas. No total, desde o passe inicial de Iniesta até ao remate de Silva para o fundo da baliza, houve oito trocas de bola. Há quem ache que isto é simples e que o que estes jogadores fazem é simplificar o jogo. Mas isto é precisamente o oposto. O futebol dos espanhóis não podia ser mais complexo e de difícil execução. É por isso que, para jogar assim, é preciso índices de criatividade elevadíssimos em todos os jogadores e uma capacidade de raciocínio muito acima da média. Aqueles toques de primeira parecem fáceis porque a bola percorre poucos metros, mas os requisitos intelectuais para se poder executar um passe daqueles não estão ao alcance de todos. Cada uma daquelas trocas de bola exige mais do que o mais fantástico dos dribles individuais, do que o mais perfeito passe longo. Estes jogadores, antes de receberem a bola, já leram a mente dos colegas e já sabem como estes se vão comportar. Para que o saibam e para que possam tirar partido disso, não precisam apenas de estar à vontade tecnicamente para jogar de primeira; precisam, sobretudo, de ter a capacidade de se colocar no lugar dos outros, isto é, precisam de uma capacidade imaginativa suficientemente ampla para que percebam não só qual a melhor solução para o lance como também de que modo está o colega a pensar. O que esta jogada está, no fundo, a fazer, de um modo bem menos perceptível, é a troçar dos Raúis Meireles da bola. Este é o futebol do futuro e, mais do que isso, o próprio indício de quais serão os mais competentes jogadores do futuro. Haverá poucas lições mais perfeitas que esta e todos os treinadores do mundo deveriam pegar neste lance e mostrá-los aos seus jogadores, dizendo de seguida: "Estão a ver? É assim que se joga futebol!"
5 comentários:
Esta Espanha está muito à frente de qualquer outra selecção e se o futebol fosse lógico, ganharia o Mundial sem problemas.
Como no futebol nem sempre ganha o melhor, pode acontecer que os nuestros hermanos não saiam vitoriosos.
Não querendo retirar mérito à jogada, ajuda o facto de os polacos não saberem defender. Se parares no segundo 11, vês que todos os defesas concentram-se no portador na bola (Iniesta) ficando 3 espanhóis livres para receber o passe. Para cúmulo um dos defesas parece fazer questão de pôr toda a gente em jogo.
MB, também acho que, embora a Espanha seja a principal favorita, não é nada certo que ganhe a competição. Por várias razões. Primeiro, não apostaria de caras nesta equipa, pois apesar do talento e da envolvência colectiva, não sei quais as competências defensivas da mesma. Do que conheço de Del Bosque, ele não era propriamente perfeito a preparar defensivamente os seus conjuntos. Depois, porque a competição em si, com várias etapas a eliminar, potencia a dúvida e o equilíbrio. A Espanha dominará, certamente, todas as suas partidas, mas nem sempre terá facilidades para chegar ao golo. Pode por isso perder por azar, ou porque encontra um adversário que defenda muito bem e que, na única vez que for à frente, faça golo, ou simplesmente por empatar a partida e acabar por ter de decidir a eliminatória na lotaria dos penálties.
Quanto à jogada, por acaso não concordo. Não que os polacos sejam prodigiosos a defender, mas nesta jogada não acho que estivessem propriamente mal. É evidente que, no momento que referes, a desorganização defensiva é óbvia. Mas creio que o é inteiramente por mérito do lance espanhol. Repara que no início os polacos estão até bem posicionados, com as coberturas bem feitas, com pouco espaço entre eles. Depois, com as sucessivas trocas de bola, acabam por se desorganizar por completo. Mas isso é inteiramente potenciado pelas trocas de bola dos espanhóis e duvido seriamente que houvesse equipa que não se desorganizasse defensivamente num lance idêntico. É esta, também, uma das virtudes deste tipo de jogo. Quanto mais passes, maior a desorganização do adversário. A cada troca de bola, cria-se a dúvida no adversário de quem deve sair ao portador da bola. Se essas trocas se sucederem rapidamente, então, vão-se acumulando dúvidas, cada adversário vai desposicionar-se momentaneamente, até que se gera o caos que se encontra no segundo 11 que referes. Essa desorganização, porém, parece-me muito mais fruto da jogada espanhola do que propriamente do facto dos polacos não saberem defender. E é isso que é extraordinário. Quanto mais vezes vejo o lance, mais me arrepio. Não estou certo de algum dia ter visto um golo tão perfeito...
Futebol de futuro? O mesmo se dizia da França e da Holanda nos anos 70. Uma, depois de 2000, só em 2006 apareceu novamente e já bastante "longe" do futebol de futuro (domenech já fazia estragos na selecção francesa)e assente basicamente em Zidane e a Holanda ficou a ver navios nos '70. Ganhou um europeu em 88 e depois, nada. Aliás, esta Espanha lembra mais essa Holanda do que outra coisa, até por serem campeões europeus, o que significa que não vão longe no mundial. Além disso, jogar com uma Polónia afastada do Mundial e cujos jogadores já deveriam estar de férias....sinceramente, não sei que raio de teste é este. E não te esqueças que o jogo ainda foi em Espanha... Agora, querer comparar o plantel espanhol com o português, é piada, só pode. É evidente que eles terão a melhor equipa do Mundial em termos de opções. Mas o Mundial é outra história, ganha quem tem mais nervo e resistência e nisso os espanhois não demonstraram nada. A atitude para ganhar a Espanha é simples: organização na defesa e não deixar-se embalar pelo joguinho deles. E ver muitas vezes o Barcelona-Inter.. lembra-te que só ganharam à Italia em 2008 nos penaltys e os EUA são uma equipa de contra-ataque, contra equipas mais fortes. Desde 2002 que sabemos isso.
"A atitude para ganhar a Espanha é simples: organização na defesa e não deixar-se embalar pelo joguinho deles. E ver muitas vezes o Barcelona-Inter.."
Cientificamente dizendo, claro.
A jogada é brilhante. Agora nao percebo essa de troçar com os ''Rauis Meireles da bola'', sobretudo que o jogador portista nao sendo brilhante como o Iniesta, é um belo jogador.
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