Ver um jogo de futebol ao vivo é fantástico. Não só pelo espectáculo por si só, mas também por outros motivos. Um deles é a oportunidade de ouvir belas pérolas ao vivo.
Num desses momentos ouvi um adepto mais exaltado gritar a plenos pulmões para o Polga, depois de este ajuizar mal um lance – coisa rara -: “ Não penses! Joga logo a bola!”. O que nos remete para a seguinte dúvida: O que é que faz deste campeão do mundo um central de méritos reconhecidos? Será a sua dureza? A sua impetuosidade? Não! A sua capacidade de analisar as movimentações adversárias, aliada ao seu jogo posicional, permite-lhe vencer maior parte dos duelos. Mais, o facto de ser inteligente, ou seja, o facto de pensar, e bem, permite-lhe ser um elemento importante na definição dos processos ofensivos da sua equipa, falo obviamente numa fase inicial mas que não é tão irrelevante quanto isso. Polga percebe de uma forma excepcional a verdadeira função do processo defensivo. Recuperar a posse da bola, não cortar a bola de qualquer forma. Recuperar a posse de bola, não desfazer-se dela, terá de ser sempre o principal objectivo deste processo.
Num raro momento de silêncio surge a plenos pulmões outra afirmação deliciosa, neste caso tendo como alvo o Miguel Veloso depois de este perder o esférico ao tentar driblar dois adversários: “ Não inventes!”. Não inventes? Então mas será que percebem a razão pela qual este miúdo se destaca? Pedir ao Miguel Veloso para não ser criativo nos seus processos é tão estúpido como convidar a Soraia Chaves para gravar um filme e não lhe exigir que faça nus.
E a partir desta parvoíce podemos perceber um erro comum de muita gente, pior ainda se no meio desta multidão incluirmos muitas pessoas com responsabilidades na definição do curso futebolístico de várias equipas.
Falo dos erros cometidos por directores e técnicos que na prospecção de talentos e reforços para as respectivas equipas apenas consideram índices físicos, ignorando os aspectos intelectuais. Deslumbrando-se preferencialmente com exibições mais exuberantes, preferindo a forma à essência, cometem-se erros atrás de erros na aquisição de jogadores. Jogadores que se destacam devido às suas características físico/atléticas (Luisão, Petit; Paredes, Liedson; João Paulo, P. Emanuel) são sempre um grande risco. Sempre demasiado dependentes de factores externos, para além do seu momento de forma, quando este não lhe é favorável o seu desempenho, na melhor das hipóteses é inócuo. Ao invés jogadores que se sobressaem pelas características intelectuais (Polga, Miguel Veloso, Custódio, Romagnoli; Nuno Gomes, Nuno Assis; Postiga, Fucile, Lucho) destacam-se não só pela sustentabilidade das suas exibições, como pela facilidade com que se adaptam a novos modelos, pois conseguem compreender as necessidades que cada modelo de jogo e sua filosofia exigem. Contudo são apenas homens e neste caso, enquanto jogadores, dependem sempre do coeficiente de inteligência dos treinadores que os orientam. Por aqui, por exemplo, se pode explicar porque razão o Assis não se impõe definitivamente no Benfica.
É verdade que este tipo de jogadores nem sempre obterá o retorno das suas virtudes da parte do público, tão pouco dos respectivos técnicos. Vejam a quantidade de jogadores que privilegiando a força bruta e descontrolada são beneficiados perante os que assentam o seu futebol num numero considerável de neurónios, poucos são os que darão preferência ao Custódio, se puderem escolher o Petit, ou então quem é que optará pelo Nuno Gomes com o Liedson no mesmo plantel?
Porém este facto ainda é mais nocivo no futebol de formação. Aqui muitos clubes ignorando a sua principal função, a formação de jogadores, optam por obter resultados fáceis e imediatos. Por outras palavras, optam por jogadores que se destacam pela força, velocidade, e qualidade técnica, em vez de promoverem aqueles que tem na sua capacidade de decisão e respectiva leitura dos lances as suas principais características. Não estou a dizer que devemos ignorar os outros factores, nada disso, apenas defendo que jogadores que sejam seleccionados pelos factores físicos, serão sempre mais difíceis de imiscuir no futebol sénior, onde o físico perde um estatuto determinante para se conseguir justificar a sua utilidade. Ser forte, rápido, e bom no um para um, é sempre relativo ao nível de exigência onde se encontram, agora uma boa opção é sempre uma boa opção...
2 comentários:
Engraçado como as opiniões sse moldam às conveniências. Polga corta com intenção "Recuperar a posse da bola, não cortar a bola de qualquer forma". Por outro lado no FCP-SCP - não há hipótese de "aquele" corte ter sido feito com a intenção de ser direccionado ao guarda-redes do Sporting. Reconheço aos autores uma qualidade de conhecimento técnico-táctico que falta à grande maioria dos nossos "opinadores" futebolísticos. Mas se para termos acesso a ela temos de "gramar" com o sportinguismo puro e duro, paciência. Acho que mesmo assim vale a pena!
Quando se fala em cortar de qualquer forma, refere-se a lances em que, mesmo apertado, não despeja a bola para a bancada ou para a frente. Mas para o fazer, isto é para decidir isso, precisa de ter a posse de bola. Alguém só pode ter uma intenção se tiver a posse de bola. Não foi o caso do célebre corte do Polga na direcção do Stojkovic. E nem todos aqui são do Sporting, atenção...
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