quarta-feira, 28 de maio de 2008

Pelé: um estudo

O jogo é o Portugal-França, na categoria de sub-21, a contar para o Torneio da Suécia. Em estudo, a exibição de Pelé, um dos novos ídolos, juntamente com o Gato das Botas e a Padeira de Aljubarrota, dos relvados portugueses. De referir, antes de começar, que Pelé esteve, na minha opinião, uns furos acima do que é normal, não abusando tanto do passe comprido, por exemplo. Isto deve-se, em parte, à forma como a equipa francesa defendeu, nunca pressionando em cima e fechando-se lá atrás, obrigando Pelé a passes mais laterais e recuados.

1 minuto: Má opção. (Recebe e dá em Manuel Fernandes, embora tivesse tido tempo para virar o flanco e pudesse, com isso, descongestionar o jogo.)

1 minuto: Boa opção. (Recebe um lançamento e entrega a Manuel da Costa.)

2 minutos: Falta. (Faz falta sem necessidade.)

5 minutos: Má opção. (Tenta driblar, perde, mas recupera graças ao porte atlético.)

6 minutos: Boa opção. (Dá atrás depois de receber.)

6 minutos: Má opção. (Drible arriscado no meio-campo que, por acaso, sai bem, havendo porém o perigo de, perdendo a bola, a França criar uma situação de superioridade numérica que era desnecessária.)

7 minutos: Mau passe. (Mau passe para a ala, a permitir a recuperação francesa.)

7 minutos: Recuperação de bola. (Recupera uma bola depois do jogador francês a adiantar em demasia.)

10 minutos: Mau passe. (Passe longo, na direcção de um francês.)

10 minutos: Má opção. (Tentativa de passe longo que acaba nas mãos do guarda-redes adversário)

15 minutos: Recuperação de bola. (Intercepta um passe e dá em Manuel Fernandes.)

15 minutos: Sofre falta. (Sofre falta à saída da grande-área, ao proteger a bola, após um ataque perigoso dos franceses.)

16 minutos: Mau posicionamento. (Demasiado subido no terreno, a permitir espaço entre linhas.)

18 minutos: Boa opção. (Devolve atrás.)

21 minutos: Mau passe. (Tenta pisar a bola, mas falha; o jogador francês escorrega e ele recupera, entregando depois mal a bola, obrigando Antunes a dividir a bola com um adversário.)

22 minutos: Mau posicionamento. (Novamente adiantado, concedendo muito espaço nas suas costas e entre os centrais.)

23 minutos: Boa opção. (Dá em Manuel da Costa.)

23 minutos: Boa opção. (Recebe e dá em Paulo Machado.)

25 minutos: Mau posicionamento. (Estando demasiado avançado, permite espaço entre si e os centrais, que Manuel da Costa tenta preencher, avançando ligeiramente; como Nuno André Coelho não acompanha, um lançamento longo apanha o avançado gaulês nas costas do defesa português, não sendo golo por manifesta falta de calma do francês.)

25 minutos: Boa opção. (Dá em Paulo Machado.)

25 minutos: Mau passe. (Executa um passe com demasiada força e para Bruno Gama, que não teria boas condições para receber a bola.)

26 minutos: Boa opção. (Devolve a Manuel da Costa.)

28 minutos: Mau remate. (Apesar de a opção não ser necessariamente má, o remate é francamente mau.)

30 minutos: Perda de bola. (Depois de a bola ter sobrado para uma zona de ninguém, tenta ganhar uma bola em habilidade, pisando-a, mas fá-lo de forma lenta e um francês rouba-lha.)

31 minutos: Boa opção. (Recebe, roda e dá em Manuel Fernandes.)

34 minutos: Boa opção. (Tabela com Manuel Fernandes, que no entanto estica demasiado o passe e o lance perde-se.)

39 minutos: Boa opção. (À entrada da área, tenta arranjar espaço para o remate; não consegue e dá para o remate de Paulo Machado.)

40 minutos: Boa opção. (Devolve a Nuno André Coelho.)

41 minutos: Ultrapassado. (É ultrapassado no um para um com relativa facilidade.)

42 minutos: Mau posicionamento. (Novamente muito subido, permite que apareça um adversário na sua zona, à entrada da área, a rematar completamente à vontade.)

44 minutos: Boa opção. (Recebe e dá em Manuel Fernandes.)

45 minutos: Má opção. (No meio-campo, com a selecção gaulesa a perder uma bola em transição e podendo jogar de forma mais cautelosa, efectua um passe longo para Edinho; este quase consegue chegar antes do guarda-redes, mas apenas porque a bola se afasta da baliza, obrigando o guarda-redes a percorrer um espaço maior.)

45 minutos: Má opção. (Com a equipa francesa descompensada, recebe uma bola de Antunes, podendo rodar o jogo para a direita, esticando-o, mas prefere fintar, voltar ao meio, perdendo a hipótese de uma transição rápida e permitindo à selecção francesa que se reorganizasse defensivamente.)

48 minutos: Boa opção. (Dá em Paulo Machado.)

51 minutos: Mau passe. (Passe sem nexo para o centro da defesa francesa.)

51 minutos: Ultrapassado. (É ultrapassado em velocidade por um adversário, junto à linha.)

55 minutos: Mau posicionamento. (Com Antunes fora a ser assistido, um dos centrais franceses entra pela esquerda da defesa e, através de um passe recuado, encontra um companheiro que tem tempo para tudo, numa zona que Pelé tinha de, obrigatoriamente, ter ajudado a preencher, coisa que não fez; do lance resulta o primeiro golo da França.)

56 minutos: Boa opção. (Dá para trás.)

58 minutos: Boa opção. (Recebe, tira um adversário e dá em Paulo Machado.)

58 minutos: Bom passe. (Passe vertical para Edinho.)

58 minutos: Ultrapassado. (Vai à queima e é ultrapassado.)

59 minutos: Corte. (Corte para o ar.)

62 minutos: Má opção. (Depois de deixar pregados ao relvado dois adversários, passando no meio deles, decide mal e entrega a bola a um adversário.)

64 minutos: Boa opção. (Entrega a Paulo Machado.)

66 minutos: Boa opção. (Recebe, dá em Manuel da Costa; este devolve a bola e Pelé abre na direita, para João Pereira.)

67 minutos: Corte. (Ganha um lance de cabeça.)

68 minutos: Má opção. (Tenta fazer uso do seu poderio atlético e segurar a bola junto à linha, quando a poderia entregar a um colega, e acaba por perdê-la.)

72 minutos: Boa opção. (Dá para Nuno André Coelho.)

73 minutos: Recuperação de bola. (Recupera uma bola.)

73 minutos: Má opção. (Depois da recuperação de bola, progride no terreno e, de muito longe e sem preparação, tenta alvejar a baliza adversária, quando se impunha que jogasse com um colega.)

75 minutos: Corte. (Corte com a ponta do pé, com a bola a sobrar para Paulo Machado.)

76 minutos: Remate. (Remate contra a barreira, na sequência de um livre indirecto.)

78 minutos: Bom passe. (Passe vertical para Hélder Barbosa.)

78 minutos: Má opção. (Ganha um ressalto; tenta fintar e perde a bola; ganha novamente o ressalto, dribla um adversário mas torna a perder a bola.)

80 minutos: Mau passe. (Mau passe para Tiago Gomes.)

80 minutos: Boa opção. (Recebe no peito e dá para Nuno André Coelho.)

81 minutos: Boa opção. (Entrega a João Moreira.)

81 minutos: Boa opção. (Dá atrás.)

81 minutos: Boa opção. (Dá a Paulo Machado.)

82 minutos: Boa opção. (Abre para João Pereira.)

83 minutos: Boa opção. (Intercepta e dá em Paulo Machado.)

84 minutos: Boa opção. (Entrega a Paulo Machado, recebe novamente e dá a Celestino.)

85 minutos: Bom passe. (Passe a abrir na esquerda, para Tiago Gomes, embora o facto de o lateral esquerdo não ter apoios tenha inviabilizado a jogada.)

85 minutos: Boa opção. (Passa a Hélder Barbosa.)

86 minutos: Mau passe. (Passe vertical para um colega que tinha marcação apertada, resultando numa bola dividida e, depois, perdida.)

86 minutos: Boa opção. (Dá atrás.)

86 minutos: Boa opção. (Recebe, tira um adversário com uma simulação de corpo e entrega bem no meio.)

87 minutos: Boa opção. (Dá para Manuel da Costa.)

87 minutos: Boa opção. (Passe lateralizado para Tiago Gomes.)

92 minutos: Má opção. (Tentativa de passe longo que acaba nas mãos do guarda-redes francês.)


Para melhor se aferirem os resultados, coloquei em negrito as acções negativas de Pelé. Vamos aos resultados:

1) 70 acções durante os 90 minutos; 41 acções positivas durante o jogo; 59% de acções positivas.
2) Em 53 lances com a bola nos pés e com condições para fazer algo (exclui-se portanto os lances de bola parada ou as disputas de cabeça, ou os lances em que procura recuperar a bola, ou os lances em que não tem a bola totalmente dominada), teve 34 boas opções contra 19 más opções; 64% de boas opções.
3) Destas 19 más opções, resultaram 15 perdas de bola, sendo que 9 delas não trouxeram perigo de maior à sua equipa, por terem ido para fora ou parar a zonas recuadas do campo, mas 6 delas provocaram desequilíbrios perigosos, permitindo à selecção francesa iniciar o seu processo ofensivo de imediato e com a selecção das quinas desorganizada defensivamente.
4) Pelé fez 3 cortes, ganhou 1 bola de cabeça e recuperou 3 bolas.
5) Fez 1 falta e sofreu outra.
6) Tentou desembaraçar-se individualmente dos seus adversários por 11 vezes, o que para um médio-defensivo é um exagero. Dessas 11 tentativas, apenas 6 foram bem sucedidas, sendo que, dessas 6, apenas 3 eram a melhor opção na altura.
7) Por sua vez, foi ultrapassado individualmente por 3 vezes.
8) Sendo um tipo que tem marcado golos que todos têm elogiado e que detém um pontapé invejável, fez 3 remates, sendo que 2 deles passaram muito por cima e outro saiu rasteiro e foi embater nos adversários que constituíam a barreira.
9) Passou o jogo todo mal posicionado, mas, em jogadas concretas de ataque francês, causou problemas à sua equipa por 5 vezes, o que, tendo em conta o pouco que os franceses atacaram, sobretudo na primeira parte, é muitíssimo. Desses lances, 1 deu golo da França, outro provocou o avanço de Manuel da Costa e o isolamento do avançado francês, outro permitiu a um francês um remate frontal, à entrada da área, sem oposição, e outros dois permitiram jogadas perigosas.
10) Efectuou 41 passes acertados contra 11 passes errados; 79% passes acertados. Este número revela que 1 em cada 5 passes de Pelé são errados. Não sendo um número muito problemático, tem de se ter em conta o risco dos mesmos. Destes 41 passes acertados, apenas 3 foram de risco elevado, sendo 2 deles passes verticais, pelo chão, que permitiram à equipa jogar entre linhas e 1 deles um passe a rasgar na esquerda. Se tivermos em conta o total dos 52 passes que efectuou, dos quais apenas 10 foram de risco elevado, vemos que apenas 19% dos passes que Pelé fez comportavam um risco elevado. Desses 10 passes de risco elevado, só 3 foram acertados, o que implica que os 79% de passes acertados diminuem drasticamente com o aumento do risco do passe. Assim, Pelé acertou 90% dos passes de risco baixo (38 passes acertados de um total de 42 passes de risco baixo) que efectuou, mas apenas 30% dos passes de risco elevado. Se é verdade que o seu acerto em passes de menor risco deve constituir prova de que conferiu alguma segurança com bola à equipa, não pode deixar de ser relevante que foi mal sucedido 2 em cada 3 vezes que tentava arriscar mais. Ora, tendo em conta o claro insucesso dos seus passes de maior risco, Pelé salvaguardar-se-á sempre que não abusar dos passes de risco elevado. Se é verdade que neste encontro obteve 79% de passes acertados, também é verdade que isso se deveu à percentagem relativamente baixa de passes de risco elevado, 19%. Uma vez que é conhecida a apetência de Pelé pelo risco, é de adivinhar que esta percentagem aumente noutros encontros, contra adversários que actuam de outra forma. Façamos um exercício: com estas contas e com uma percentagem de, por exemplo, 38% de passes de risco, o correspondente ao dobro do jogo de hoje e mais condizente com a apetência dele, Pelé teria, em 52 passes, 20 passes de risco, dos quais acertaria apenas 6; dos restantes 32 passes de risco menos elevado, à percentagem de 90%, Pelé acertaria 29; assim, com uma percentagem de passes de risco elevado nos 38%, Pelé acertaria, em 52 passes, apenas 35 e já não 41; o seu índice de passes acertados desceria de 79% para 67%. Se é evidente que 79% de passes acertados, não sendo uma marca óptima, é uma marca relativamente boa, não deixa de ser menos verdade que, num jogado mais normal de Pelé (como já o demonstrou noutras partidas, gosta de arriscar passes mais longos) esse índice relativamente bom tende a decrescer consideravelmente.

Notas finais: Tendo a equipa portuguesa a bola, Pelé raramente ofereceu linhas de passe aos colegas, andando nestas alturas a passo. Sem bola, quer em missão defensiva, quer ofensiva, foi um desastre, errando em termos posicionais como um principiante. Esta falta de aptidão para oferecer apoios ou para perceber que espaços deve ocupar nas diferentes situações de jogo são, talvez, o seu maior defeito. Sem bola, portanto, fica evidente que Pelé tem graves deficiências. Com bola, durante esta partida, não esteve tão mal como noutras alturas, sobretudo porque optou por não arriscar tanto quanto costuma. Ainda assim, para um jogador na sua posição, abusa de iniciativas individuais desnecessárias e não garante a segurança no passe que se desejaria. Como se não bastasse, não foi (nem é, normalmente), um jogador concentrado, andando a passo em muitas situações em que se exigia uma resposta rápida da sua parte. Esta lentidão de processos agravou-se ainda com a pouca disponibilidade de Pelé para as bolas divididas, coisa que, de acordo com o seu porte atlético, deveria ter facilidade em ganhar. Sabendo-se que Mourinho espera dos seus jogadores, além de inteligência e interesse pelo jogo, concentração máxima, estou em crer que Pelé precisa de modificar muito do seu futebol para entrar nas contas do técnico português.

Ainda sobre este encontro:

1) Um dos comentadores de serviço lembrou-se de comparar Nuno André Coelho a Ricardo Carvalho. O que eu gostava de saber era em que esquina esse indivíduo bateu com a cabeça.

2) A selecção nacional é das mais miseráveis de que me lembro neste escalão. Do onze inicial, aproveita-se um: Carlos Saleiro. O resto são tipos sem potencial, ou com menos potencial do que se diz, ou que pararam de evoluir, embora tivessem um potencial considerável.

3) Manuel da Costa foi repreendido por Rui Caçador e meio país ficou espantado. Foi preciso uma coisa dessas para se perceber que o jogador português é horrível na interpretação dos lances e na forma como abusa em subidas sem nexo, ou em lances individuais, ou em habilidades sem sentido?

4) Hélder Barbosa continua a não ser opção para Caçador. Agora, o melhor extremo português desta idade até já se vê ultrapassado por um ponta-de-lança adaptado... e que ainda por cima não tem idade para jogar nesta selecção. Brilhante!

5) E Fábio Coentrão, não?

6) Os comentadores disseram ainda que Pelé estava cansado, após uma época longa e desgastante. Segundo eles, o internacional português jogara mais de 20 jogos em Itália, tendo-se afirmado na equipa do Inter como poucos esperariam. Ya, ya. Pelé jogou 4 jogos a titular no campeonato, tendo entrado noutros 9. São 13. 496 minutos jogados. Isto é afirmar-se como?

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Os melhores

Eis os melhores da Liga 2007/2008:

Guarda-Redes: Diego Benaglio
Defesa Direito: Bosingwa
Defesa Esquerdo: Léo
Defesas Centrais: Polga e Rodriguez
Médio-Defensivo: Paulo Assunção
Médios-Ofensivos: Lucho Gonzalez e Rui Costa
Extremos: Quaresma e Vukcevic
Avançado: Lisandro Lopez

Treinador: Carlos Carvalhal

Os suplentes:

Guarda-redes: Quim
Defesa Direito: Ricardo Esteves
Defesa Esquerdo: Carlos Fernandes
Defesas Centrais: Geromel e Tonel
Médio-Defensivo: Delfim
Médios-Ofensivos: Moutinho e Zé Pedro
Extremos: Tarik Sektioui e Christian Rodriguez
Avançado: Roland Linz

Treinador: Manuel Cajuda

Os que também poderiam ter sido eleitos, mas que por esta ou aquela razão não foram:

Guarda-Redes: Eduardo, porque só podia escolher dois guarda-redes.
Defesas direitos: Abel, porque revelou lacunas defensivas graves; Nélson porque perdeu toda a confiança que tinha quando chegou ao Benfica; Andrezinho, porque embora seja muito forte a atacar, é muito fraco a defender.
Defesas Esquerdos: Rodrigo Alvim, porque só podia escolher dois.
Defesas Centrais: David Luiz, porque passou grande parte da época lesionado e nunca conseguiu atingir um nível exibicional constante; Bruno Alves por razões óbvias.
Médios-Defensivos: Miguel Veloso, porque apesar de ter começado e acabado confiante, passou grande parte da época num nível medíocre; Raúl Meireles, porque num esquema como este não poderia ser médio-defensivo, e para médio ofensivo havia melhores; Ruben Amorim, porque só podia escolher dois e a sua posição também não é a de médio mais recuado; Roberto Brum porque só podia escolher dois; Katsouranis, porque fez uma época bem abaixo do desejável, tendo muitas vezes actuado como defesa central.
Médios-ofensivos: Romagnoli, porque as suas exibições sofrem quando a equipa está mal e, como tal, passou ao lado de bastantes jogos. Fajardo, porque não conseguiu manter os níveis do início da temporada, nem foi capaz de ser, como o foi na altura, o jogador mais preponderante do Guimarães; Jorge Ribeiro porque a médio é banal, apesar dos golos que consegue, fruto do seu bom pontapé.
Extremos: Hélder Barbosa, porque alguém decidiu ir buscá-lo a meio da época para pô-lo no banco; Matheus porque beneficiou claramente por estar incluído num colectivo forte, ressentindo-se quando trocou de ares; Fellype Gabriel porque não pôde jogar regularmente e manter o bom nível do início da temporada; Di Maria, porque alternou entre exibições formidáveis e momentos menos bons, quase todos por estar incluído numa equipa sem rumo; Alan e João Ribeiro porque só podia escolher quatro.
Avançados: Cardozo, Cláudio Pitbull, Roncatto, Weldon e Wesley por só poder escolher dois; Liedson por razões óbvias.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Curtas de fim de época

1. Sem jogar tanto como a Fiorentina, o Zenit venceu o Rangers e vingou italianos, portugueses, alemães e gregos. Contra equipas que só defendem, a arte e o engenho são, por certo, o caminho mais curto para o sucesso, mas, como fica bem visível nesta final, bastava um lance para que a equipa escocesa não fosse capaz de virar o rumo dos acontecimentos. Ficou também visível que os escoceses, em todas as eliminatórias que superaram, nunca controlaram os desafios, deixando-se à mercê da sorte, que lhes foi sendo favorável. Desta vez, e como não é possível ter sempre sorte, a justiça imperou. Seria frustrante para o futebol que, depois da Grécia de Rehhagel, o Rangers de Walter Smith ganhasse alguma coisa a jogar assim.

2. No Benfica, afinal, Eriksson já não vem. Confesso que o sueco não correspondia ao perfil de treinador que acho adequado para o Benfica, mas a sua personalidade e o seu profissionalismo convenciam-me de que era a melhor das alternativas até então apresentada. Gorada, portanto, a possibilidade Eriksson, o Benfica vira-se para Quique Flores. Formidável! O que o Benfica precisava era mesmo de um tipo que gosta de jogar com 4 defesas centrais...

3. Rui Costa cessou funções como jogador e, no dia seguinte, estava, vestido a rigor, a iniciar uma nova etapa na carreira, num novo cargo. A primeira notícia: renovação com Léo. Parece começar com a classe com que acabou.

4. Scolari revelou os 23 eleitos para o Euro 2008. Não convocar Maniche, Carlos Martins, e Caneira são, para mim, os principais equívocos do seleccionador. Não levando Bruno Alves nem Jorge Ribeiro, e abdicando ou de um dos avançados, ou de Raúl Meireles, ou mesmo de Miguel, estes três caberiam perfeitamente no lote de convocados, ficando o mesmo muito mais equilibrado. Assim, não há alternativas reais a Deco; vão 4 centrais e 4 laterais; vão apenas 5 jogadores de meio-campo; e ainda vai um jogador que, se é lateral, mais valia Caneira (podendo, pela polivalência deste, não levar um dos centrais), se é para o meio-campo, havia claramente melhores. Tirando tudo isto, é ainda tempo para falar de jogadores que nunca foram aposta de Scolari, mas que mereciam, pelo menos, ter sido testados. São eles Zé Castro, Pedro Mendes, Paulo Assunção e Nuno Assis.

5. Na taça de Portugal, Jesualdo Ferreira voltou a tentar adaptar a sua equipa à forma de jogar do Sporting. E voltou a perder. Burros velhos não aprendem mesmo línguas...

6. O Sporting fez das exibições mais adultas da época: dominou sempre o jogo, teve muito mais posse de bola, soube sempre evitar o pressing portista, nunca se descontrolou emocionalmente e nunca se desequilibrou no campo. A juntar a isto, conseguiu uma coisa que jamais conseguiu esta época: penetrações pelo centro do terreno. A isto se deveu o excelente desempenho dos avançados, sobretudo de Derlei, a segurar a bola de costas para a baliza, permitindo a entrada dos colegas nas costas ou tabelando com os mesmos, entrando em posse em zonas perigosas. Quem é que não jogou mesmo no sector ofensivo?

7. Rochemback é reforço leão para a próxima temporada. Acho-o um bom reforço, mas a euforia leonina é exagerada. É um jogador experiente, com qualidades, mas não inventem coisas que não são verdade. Não é um jogador concentrado, nem um jogador intenso, nem alguém preponderante no desempenho defensivo da equipa, nem sequer um jogador muito correcto do ponto de vista posicional. As suas principais virtudes são o discernimento e a tranquilidade com que joga, sabendo pautar com rigor os ritmos da equipa; a facilidade com que tem a bola no pés e a capacidade técnica e atlética, que lhe permite ganhar muitos dos duelos individuais. Agora, não é jogador de grandes rasgos, e muito menos um jogador de equilíbrios. Também não é jogador para grandes correrias, pelo que, na posição 10 do losango, a mais exigente sem bola, é desadequada. Do meu ponto de vista, Rochemback pode ser uma mais-valia, mas nunca para médio-defensivo ou para médio-ofensivo no losango do Sporting. É apenas como interior que o vejo a poder render e apenas se Moutinho sair.

8. Rijkaard despede-se de Barcelona com uma vitória por 5-3 e a sensação de que poucos treinadores poriam uma equipa a jogar tanto à bola como a sua. É verdade que os intérpretes contam, mas a equipa de Rijkaard, em bom ou em mau estado, apresentou sempre dinâmicas colectivas que poucas equipas apresentaram. As trocas sucessivas de bola nas imediações da área, as triangulações curtas e rápidas que desposicionavam facilmente os oponentes e a quantidade de posse de bola por jogo não terão mesmo comparação com qualquer outra equipa dos últimos tempos. Se o Barcelona campeão europeu em 2006 foi, por muita gente, considerada a equipa da década, não será demais elogiar o trabalho do holandês e colocá-lo também entre os melhores treinadores dos últimos anos.

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Chegou ao fim!

Chegou ao fim a carreira futebolística de um dos mais fantásticos jogadores de sempre do futebol português. Ontem, dia 11 de Maio de 2008, Rui Costa pendurou as botas. Nesta hora, ao invés das lágrimas do adeus, apetece-me lembrar tudo o que ele foi. Laudrup disse, ao terminar a carreira, que em poucos anos deixaria de haver jogadores como ele: referia-se aos números 10 puros, ao tipo de jogador que comanda o leme de uma equipa, que puxa todos os cordéis ofensivos, que dribla, passa e remate como se estivesse a executar a mais simples das tarefas. Rui Costa é um desses últimos jogadores. Foi o meu primeiro grande ídolo! Depois dele, teria vários, é certo, mas foi com ele que aprendi a sorrir perante um jogo, foi ele o primeiro a quem quis imitar os movimentos. Numa das muitas inconfessadas ilusões infantis, desejei ser jogador de futebol e imaginei-me ao lado dele num campo. É justo, portanto, dedicar-lhe, na despedida, tudo o que puder dedicar. As recordações são imensas e seria impossível distinguir todos os grandes momentos da sua carreira. Quero, porém, neste momento, relembrar aqueles que mais me marcaram: o penalty decisivo que deu a vitória do mundial de sub-20 em 1991; o chapéu perfeito frente à Irlanda, na Luz, que abriu caminho à vitória que nos levaria ao Euro 96; o melhor jogo que o terei visto fazer, um Portugal-França de carácter amigável, em 96, cujo resultado final foi de 3-2 para os franceses, mas durante o qual Rui Costa parecia um objecto estranho, um fenómeno de outro planeta, com uma alegria a jogar que nunca mais lhe vi repetida, coroada com um golo que ilustra toda a sua classe; os incontáveis últimos passes para Batistuta na Fiorentina; o passe de morte, após uma jogada brilhante de toda a equipa, para o golo do empate frente à Inglaterra, na mítica reviravolta do Euro 2000; o golo de raiva frente à Inglaterra no Euro 2004, calando ingleses e portugueses. Pelo meio, aquela expulsão absurda frente à Alemanha, que o pôs a chorar pela injustiça e posicionou todo o povo lusitano contra o árbitro Marc Batta. Era em tudo isto e em muito mais que pensava ontem, na Luz, quando fui dedicar o meu preito ao grande maestro.

Figo terá dito que Rui Costa é maior que o Benfica. Atrevo-me a dizer que Rui Costa é maior que o futebol! São raríssimos os exemplos de jogadores que conquistaram tantos corações. Portugueses, florentinos e milaneses. Além dos corações, que nunca decepcionou, Rui Costa ganhou o respeito do mundo: a carta que o Milão lhe endereçou, agradecendo-lhe, é das demonstrações mais fortes do homem que foi. Ontem, dia 11 de Maio, apesar do quarto lugar do Benfica na Liga, a emoção e os festejos terão sido certamente maiores, mais significativos, e, daqui a uns anos, mais lembrados, do que os festejos portistas, com a conquista de mais um título, ou do que os festejos leoninos, pelo acesso directo à Liga dos Campeões, ou ainda do que os festejos vimaranenses, por uma classificação inédita. É que, de um lado da balança estavam os sucessos desportivos, efémeros por excelência; do outro, estava uma carreira ímpar, um homem como poucos, que tão depressa não será esquecido. Fica até a sensação de que a ele, Rui Costa, muito mais do que a qualquer outro jogador da sua geração, todos os eventuais erros seriam perdoados. E isso não é toda a gente que consegue. Tenho praticamente a certeza de que, se se despedisse, como Zidane, com uma agressão numa final de um campeonato do mundo, seria mais celebrado do que criticado.

Chega, pois, o fim de uma etapa na sua vida. Os relvados agradecem a sua passagem e choram o desaparecimento de um dos últimos românticos. Laudrup - confesso-o com pena - tinha razão: o futebol caminha numa direcção na qual os jogadores como ele tendem a desaparecer. Depois de Zidane, é a vez de Rui Costa. Sobra ainda Riquelme, afastado contudo dos grandes palcos. Teremos um dia ainda a possibilidade de inverter esta tendência e recuperar este tipo de jogadores, agora tão em desuso? Seria bom, para o futebol, que sim. Rui Costa disse, no fim da partida, que, no final da carreira, preferia rir, em vez de chorar, como tantas outras vezes. Também eu, em vez do pranto, deixei escapar um largo sorriso. Porque Rui Costa vale mais que lágrimas; vale o esforço de as conter perante a inevitável certeza de que tudo chegou ao fim e de que não mais se repetirão as proezas com que tantas vezes nos deliciou.

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Clássicos: (Taça dos Campeões Europeus 86/87 - FC Porto vs Bayern de Munique)

A equipa de Artur Jorge actuou num 451, mostrando desde logo respeito e receio dos germânicos. Mlynarczyk na baliza, João Pinto à direita e Inácio à esquerda, Celso e Eduardo Luís no centro da defesa. No meio-campo, Jaime Magalhães à direita e Quim à esquerda eram quase segundos laterais. André, Sousa e Madjer ajudavam a fechar o meio, ficando o ataque entregue única e exclusivamente a Paulo Futre. O Bayern tomou, por isso mesmo, conta do jogo logo de início e só em fugazes contra-ataques, normalmente lançamentos para a velocidade de Futre, o Porto conseguia sacudir a pressão germânica. Em largura, a equipa defendeu muito mal, sendo os alemães capazes de chegar à linha para cruzar com muita frequência. As figuras em maior evidência, nesta fase, foram o lateral direito Winklhofer e o extremo-esquerdo Ludwig Kögl, um jogador velocíssimo e dotado de uma requintada técnica. Os alemães iam causando cada vez mais perigo até que, num lance esquisito, após um lançamento lateral, a bola sobra para Kögl, que, na área, mergulha e faz, de cabeça, o primeiro golo. Não fica, contudo, isento de culpas o guardião portista, que saíra dos postes sem necessidade. A partir desta altura, sensivelmente a meio da primeira parte, o Porto não mais foi capaz de lançar os seus contra-ataques, apesar de Madjer ter avançado no terreno, para o lado de Futre. A equipa enervou-se e perdeu bastantes bolas, coisa que os alemães aproveitaram. Apareceu nesta fase Lothar Matthäus, com vários passes de morte, não aproveitados pelos seus companheiros. Entretanto, Kögl continuava a fazer o que queria de João Pinto, rubricando uma exibição fantástica. O resultado de 1-0 ao intervalo era lisonjeiro para aquilo que o Porto tinha feito.

No segundo tempo, Artur Jorge lançou Juary, tirando Quim. Puxou Sousa para a esquerda e o brasileiro passou a fazer companhia a Futre na frente. Isto teve o condão de soltar mais o 10 portista, que começou a pôr em água a cabeça aos alemães. Já na primeira parte fora travado em falta várias vezes, mas nesta segunda parte seria ainda mais castigado. O Bayern, apesar da maior audácia portista, nunca se enervou e continuou a controlar a partida. Os primeiros 25 minutos da segunda parte foram repartidos e nenhuma equipa se superiorizou à outra, acumulando-se jogadas de ataque nos dois meios-campos. De assinalar, nesta fase, um excelente remate de Madjer, após um ressalto, que levou a bola a sobrevoar a barra da baliza, bem como um lance na área portista, em que João Pinto derruba Kögl e o árbitro não vê. Logo após este lance, surge a melhor jogada de todo o encontro, iniciada numa tabela de Futre com Jaime Magalhães. O 10 do Porto, recebendo a bola de Jaime, entra então na área com ela dominada, ultrapassa dois adversárias, sentando-os, e remata a rasar ao poste direito da baliza de Pfaff: era o sinal do que viria a seguir. Antes ainda da reviravolta no marcador, nota para uma entrada assassina de Celso, que viu apenas amarelo; para um lance anedótico em que Celso trava Kögl e no qual o árbitro, em vez de dar o segundo amarelo ao central portista, assinala falta contra o Bayern por interpretar que o extremo alemão mergulhara; e para uma sucessão de faltas e de protestos de Jaime Magalhães que lhe poderiam ter valido o segundo amarelo. Artur Jorge faz então entrar Frasco e, minutos depois, numa altura em que o Bayern até já sacudira a maior pressão dos portugueses, um passe em profundidade encontra Juary, que toca pela segunda vez na bola durante os 30 minutos que já estava em campo; este dá para Frasco, que tira um adversário do caminho e cruza; a bola encontra novamente Juary, que remata; o remate vai encontrar Madjer que, de costas para a baliza, já sem Pfaff, utiliza o calcanhar para igualar a partida. Após este lance, Madjer saiu do terreno para ser assistido e, ao reentrar, cria um desequilíbrio na esquerda. Recebe um passe longo, dá um nó de todo o tamanho em Winklhofer e, já em esforço, cruza para Juary que, sem oposição, encosta para o 2-1: estava dada a volta no marcador. Até ao final, o Porto limitou-se a pontapear a bola para onde estava virado e a queimar tempo, sendo que os germânicos perderam todo o discernimento que tinham e não foram capazes de voltar a criar situações de real perigo.

Notas Finais:

1) O Porto venceu num jogo em que foi claramente inferior, aproveitando um lance fortuito e uma desconcentração germânica para marcar. Além de Futre, que conseguiu sempre, através da sua técnica e da sua velocidade, ameaçar as hostes alemãs, e de alguns pormenores de Madjer e Sousa, pouco ou nada o Porto fez para merecer igualar o marcador. Em termos tácticos, os alemães foram superiores até à altura em que sofreram dois golos de rajada, nunca perdendo o domínio dos acontecimentos, gerindo ritmos e conseguindo levar o jogo para longe da sua área. Foi, pois, em pequenos detalhes que o jogo se definiu. Poder-se-ia dizer que as opções de Artur Jorge foram acertadíssimas, mas nem isso é bem verdade. Até à altura do primeiro golo, o Porto da segunda parte limitou-se a chutar bolas para as costas da defesa do Bayern, a solicitar a velocidade de Juary, sendo que os lances raramente assustavam os germânicos. O brasileiro, que acabou por ser decisivo e esteve nos dois golos, tocou três vezes na bola em 33 minutos, o que revela que não teve muito a ver com a vitória. Os lances dos golos nada tiveram a ver com uma mudança de atitude ou com uma melhoria do futebol do Porto: foram lances isolados e o êxito dos mesmos deveu-se a um ou outro detalhe, como o facto de Madjer, no lance do segundo golo, não estar marcado por ter acabado de reentrar na partida.

2) O homem da partida foi Ludwig Kögl, que não parou um minuto e levou tanta ou mais porrada que Futre. Do lado dos germânicos, há ainda a destacar a excelente exibição de Matthäus e alguns pormenores de Rummenigge (irmão de Karl-Heinze Rummenigge), enquanto que no Porto os melhores foram Futre, Madjer e Sousa.

3) Nota negativa, do meu ponto de vista, para Jaime Magalhães, que passou o jogo a refilar e só não foi expulso porque o árbitro não quis, que teve uma entrada maldosa sobre Kögl, já com um amarelo, não tendo ido para a rua uma vez mais por caridade, e que, depois do 2-1, sempre que o árbitro interrompia o jogo, ia a correr e dava uma biqueirada na bola para o mais longe possível, sem sofrer as devidas consequências desse comportamento.

4) A estratégia inicial de Artur Jorge revelou-se perfeitamente errada e o Porto só não foi para o intervalo com uma desvantagem maior por manifesta incompetência dos avançados alemães na hora da finalização. Além disso, o lance do penalty na área do Porto poderia ter sentenciado o jogo.

5) Fica, pois, para a História, um Porto desconhecido que vergou e humilhou o arrogante colosso alemão. Fica para a História um Golias caído aos pés de um David. E o que a História nos deixou, aquilo que fica, é que o Porto foi um justo campeão. Ainda que a outra história, com "h" pequeno, a história do jogo, tenha sido um pouco diferente daquilo que a História com "H" grande preservou.

domingo, 4 de maio de 2008

Erro de Casting ou Casting Errado?

Luís Freitas Lobo, num artigo sobre Tiago, explica, e bem, por que razão o internacional português não rendeu o que se esperaria dele nesta época. Diz Freitas Lobo:

"Na Juventus de Rainieri, [Tiago] entrou num 4x4x2 clássico em linha e com grande distância entre-linhas como um dos membros de um duplo-pivot central. Deixou de ter apoios para jogar curto, tocar e desmarcar-se, numa progressão apoiada, até à entrada da área, para ter à sua frente um corredor inteiro para percorrer, seja em posse, seja à espera de um passe, seja na recuperação. Não é este o habitat indicado para o futebol de Tiago. Assim, fica fora dos timings do jogo, ritmos e espaços."

Concordo, na íntegra, com isto. Acho que as características de Tiago não lhe permitem ser um jogador de topo neste sistema e, mais, que o 442 clássico, além de todas as lacunas que lhe reconheço, é das tácticas nas quais os jogadores têm de ser mais completos. Porque o futebol caminha na direcção da especialização, a própria táctica é um fóssil. Por exemplo, um médio de topo neste sistema tem de ser óptimo a atacar e óptimo a defender, tem de ser criativo, saber ler o jogo e, ao mesmo tempo, correr quilómetros (o que provoca desgaste, sobretudo psicológico, e retira discernimento), ser forte nos duelos corpo a corpo, etc. Para uma táctica destas, há poucos médios de qualidade. O melhor, aquele que melhor se enquadra neste sistema, que tanto ataca como defende com qualidade, talvez seja Steven Gerrard. Tendo em conta tudo isto e tendo em conta que Tiago nunca se evidenciou num sistema idêntico, que foi sempre um jogador de apoios curtos, não seria de espantar que não fosse capaz de vingar na Juventus. Outro exemplo foi Hugo Viana no Newcastle, ou no Valência. Diz ainda Freitas Lobo:

"O seu melhor lugar é como um dos médios interiores no vértice avançado de um meio campo em triângulo só com um pivot-defensivo. Ou seja, no centro de um 4x3x3. Assim, sente as costas protegidas por um trinco forte e depois, de perfil com outro médio culto, faz as transições defesa-ataque-defesa. Foi assim, com as linhas próximas, que brilhou no Lyon, à frente de Diarra, e a lado de Juninho. Tal como fez no Chelsea."

Sem dúvida. Mas num 442 losango também renderia, como interior. Ou em qualquer táctica que privilegie o jogo em apoios, na qual tenha, a seu lado, alguém com quem trocar a bola, para que nunca tenha de jogar comprido, ou de fazer uso da capacidade de transporte, aspectos do jogo em que é um jogador mediano. Os seus melhores jogos na selecção foram ao lado de Deco, porque aí consegue ter alguém que lhe facilite o jogo, que lhe dê soluções colectivas e não o obrigue à individualidade, na qual é banal.

Tiago é um jogador de colectivo e não tem capacidade para resolver sozinho os problemas da equipa, seja a construir o jogo ofensivo, seja a transportar a bola, seja a jogar comprido, seja a recuperar bolas ou a ganhar lances de cabeça. Nesse sentido, jamais se integraria com facilidade numa táctica como o 442 clássico, que é uma táctica iminentemente individual, que não privilegia um jogo em apoios e na qual os jogadores têm de acumular funções.

Freitas Lobo resume bem os porquês de Tiago ter tido uma época tão abaixo do que se esperaria dele, mas fica por aí. Quero pegar no seu argumento para concluir três coisas que não poderia deixar de dizer:

1) Que o 442 clássico - repetindo o que disse acima - no contexto actual do futebol, é uma táctica que não privilegia o colectivo e que os jogadores, sobretudo os do meio-campo, são obrigados a preencher espaços maiores, a esforços redobrados, a demasiadas tarefas e funções. Isto faz com que um jogador de meio-campo, para ser eficaz nesta táctica, tenha de possuir uma capacidade que só os melhores do mundo possuem. Neste contexto, esta táctica só poderá ser desempenhada com sucesso por equipas com capacidade para contratar os melhores do mundo.

2) Que não foi Tiago em si, ou seja, o jogador, quem falhou, mas sim a contratação de Tiago. Quero com isto dizer que, tendo o aval de Ranieri (desconheço se o teve, mas tenho de partir do pressuposto de que teve), a contratação de Tiago foi um erro. Se o plano era jogar em 442 clássico, o treinador italiano deveria ter percebido que Tiago não era o jogador ideal para esse sistema, uma vez que as suas características são totalmente opostas às que se requerem num médio nesta táctica. Ranieri terá contratado, então, Tiago pelo bom futebol que praticou noutra equipa, não tendo em conta as suas características, mas apenas a posição que ocupava em campo. Em vez de querer um médio competente para um 442 clássico, terá apenas desejado um médio.

3) Que este tipo de erros grosseiros (como foi exemplo também a contratação de Leandro Lima, um médio de toque curto, para jogar entre linhas, coisa que a equipa de Jesualdo não contempla) denota a incapacidade da grande maioria dos treinadores em reconhecer os atributos de cada jogador, bem como a incapacidade destes para perceber que os atributos intelectuais são de todo mais importantes na adequação de um jogador a um modelo de jogo do que os atributos técnicos e físicos. É fácil, portanto, concluir que Ranieri, como Jesualdo, como grande parte dos treinadores, olha apenas para os atributos técnicos e físicos dos jogadores, descuidando os atributos intelectuais, sem dúvida mais relevantes. Em Tiago, ter-se-á visto que é um jogador de boa técnica, com boa capacidade de passe e remate, mas não se terá visto, com certeza, que não é um jogador para ritmos demasiado altos, que é bom a nível posicional, fornecendo correctamente os apoios, que reconhece que os processos ofensivos passam por diferentes etapas, que não arrisca passes demasiado longos, privilegiando a segurança e a posse de bola, que precisa de ter várias soluções de passe perto de si, pois não é forte em acções individuais, etc. São estes atributos, estas capacidades intelectuais e não as capacidades técnicas e físicas, que definem a posição de um jogador, bem como o papel que o mesmo pode desempenhar num colectivo. E foram estes atributos intelectuais que não se tiveram em conta quando se decidiu contratar o internacional português.

Discordo, portanto, que Tiago tenha sido um erro de casting. O próprio casting (bem como a quem competia fazê-lo) esse sim, é que foi um erro.

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Pequenas coisas

1. O Porto acaba o campeonato a golear o segundo classificado, em casa deste, e a aumentar a diferença que o separa dos que o seguem. A confiança tem destas coisas. Há quem diga que os vinte e tal pontos reflectem a diferença de nível entre os dragões e os opositores, mas tal é pura ilusão. Se a conquista do campeonato não sofre contestação, já a diferença pontual só pode reflectir que, sem pressão sobre si e estando os opositores pressionados, uma equipa parece sempre mais superior do que o é, na realidade.

2. O Benfica venceu o Belenenses e assegurou, antes da decisão do caso Meyong, que pelo menos o quarto lugar não lhe foge. Como em vez de se pensar com cautelas a próxima época, já se anda a contratar tudo o que tenha duas pernas, esta é uma classificação que, em futuras temporadas, talvez seja satisfatória.

3. O Sporting venceu o Marítimo, com um golo de matraquilhos. Se a bola tivesse batido em Liedson e não em Romagnoli, aposto que se imaginava logo que aquele lance absolutamente fortuito tinha sido precipitado pela disponibilidade e pela entrega do "Levezinho", que teria feito uso da sua ímpar capacidade de pressão para enervar o defesa madeirense, levando-o a chutar contra si.

4. José Mota foi atropelado por um jogador do Braga, quando se encontrava junto à linha lateral. Ficou com cara de poucos amigos, mas não sei se por causa do acidente, se por a roda da fortuna, esta época, estar em sentido oposto ao da época passada.

5. Manuel Machado foi despedido e o Braga voltou a ganhar. Coincidência?

6. A Naval garantiu a permanência e Delfim, o autor do golo da vitória, foi expulso por uma mão na bola a meio-campo. Este é daqueles casos que, às vezes, merecia que se fechassem os olhos.

7. Na Champions, o Manchester, mais continental do que seria de esperar, mas menos continental do que têm dito, ganhou o direito à final, depois de 180 minutos a defender. O Barcelona, com 90 minutos de grande futebol e alguns bons momentos nos outros 90, acabou por claudicar após um erro individual. A este nível, é verdade, um erro daqueles pode ser fatal, mas não me tentem convencer de que passou a melhor equipa, porque isso não aconteceu. Uma equipa que só defende, por melhor que o faça, não merece nunca ganhar um jogo. Merece-o ainda menos se do outro lado estiver uma equipa que ataque como dever ser. Mas o futebol é assim e lá vamos ter a final inglesa que tantos ceguinhos queriam...

8. No duelo individual entre o melhor do mundo em 2007/2008 e o melhor do mundo em termos absolutos, Ronaldo levou uma cabazada de Messi. Apesar de tudo, o português deverá ganhar o prémio de melhor do mundo, sem contestação, por tudo o que fez de bom esta temporada.

9. O Chelsea mostrou que, nesta altura, é talvez a equipa inglesa com maior frescura física. Depois de vencer o Manchester para o campeonato, conseguiu superar o Liverpool e está na final da Champions. Um final de época absolutamente fantástico, com hipóteses de ganhar algo. O que não é tolerável é que, por causa deste final de época, esqueçam a final da taça da Liga com o Tottenham, bem como o resto da temporada e todos os records que Mourinho bateu em Inglaterra, pondo em cima da mesa idiotices como a comparação entre Grant e o Special One...

10. O Zenit esmagou o Bayern. Memorável!

11. O Rangers eliminou o Panathinaikos, o Werder Bremen, o Sporting e a Fiorentina com uma média de 2 ou 3 remates por jogo. Se os leões não foram muito competentes na forma de atacar o sistema ultra-defensivo dos britânicos, a Fiorentina, só no jogo da segunda mão, criou perto de 20 oportunidades de golo. Não via uma equipa com tanta sorte desde a Grécia de 2004.

12. Esta Fiorentina é só mais um exemplo daquilo que o futebol italiano já não é. O 4º lugar na liga, à frente de Milan e Lazio, por exemplo, assim como a chegada até esta fase da UEFA, denotam bem a qualidade da equipa. O sistema de jogo é o 433, com um só pivot-defensivo. A quantidade de jogadores com características ofensivas é notável: o jogador mais recuado do meio-campo, Liverani, era originariamente um médio de características ofensivas; Jorgensen e Gobbi, os laterais, são de origem médios. Esta é, verdadeiramente, uma equipa italiana virada para o ataque. Fiorentina, Roma, Inter, Juventus e Milan: os primeiros cinco do campeonato italiano já não jogam à italiana. Após a decadência da última década, em que os emblemas mais fortes, encostados ao poderio financeiro, se deixaram embalar e não acompanharam as inovações tácticas, eis que ressurge o futebol transalpino. Neste momento, a Inglaterra está no topo, com os grandes clubes a reinarem na Europa, mas a competitividade do campeonato interno não consegue acompanhar a do campeonato espanhol e a do italiano e essas grandes equipas, munidas dos melhores elementos disponíveis no mercado, descuidam a evolução táctica, fechando-se defensivamente e entregando as iniciativas ofensivas a esses elementos. Estão no mesmo ponto que o futebol italiano no início dos anos 90. É um novo ciclo que se está a iniciar e não prevejo, para o futebol inglês, nada mais nada menos que o mesmo destino que o italiano teve e que o fez, ao fim de décadas de uma herança defensiva, modificar-se radicalmente para poder sobreviver.

13. Em jogo a contar para a primeira jornada da Fase Final do Nacional de Júniores, o Sporting bateu o Benfica por 2-1. O 442 clássico de João Alves foi angustiante, sobretudo pela rigidez a que a equipa esteve sujeita e pela colocação do melhor jogador encarnado, o capitão Miguel Rosa, de origem um médio-ofensivo, o melhor na construção de jogo, no flanco direito. Já o Sporting, apresentou um 433 defeituoso, com rotinas mal trabalhadas e uma defesa assustadora. Diogo Rosado, o melhor dos leões e o único com boas ideias em todo o jogo, foi alvo da estupidez da massa associativa. Tudo começou quando, ao reparar que um colega precisava de assistência, escorregou quando se preparava para chutar a bola para fora. Cordialmente, os jogadores do Benfica seguiram a jogada e empataram o jogo. A partir daí, sempre que tocava na bola, era assobiado e insultado. Apesar de nunca ter virado à cara à luta e de ter sido dos que mais empenho demonstrou, não lhe perdoaram aquele lance, bem como outros em que, mais por erros dos companheiros do que por seus, perdeu a bola. Chegaram a dizer que era o Farnerud dos júniores, com toda a carga negativa que tal associação comporta. Até que ganhou uma falta depois de driblar um adversário junto à linha de fundo. Nessa altura, gostaram. Mas, nessa altura, deviam estar caladinhos. Se por acaso tivesse marcado o golo da vitória, as mesmas pessoas que disseram mal deveriam ser obrigadas a sair do estádio, a não festejar o golo. E não é porque não devem criticar os jogadores da sua equipa; é mesmo porque não perceberam, sequer, que estava a ser o melhor em campo. A estupidez do adepto comum é gritante! Este miúdo estará, nos próximos anos, entre os melhores jogadores portugueses e os adeptos que hoje levantaram a voz para dizer mal dele deveriam pagar imposto para festejar os seus futuros êxitos. Em cima dos 90 minutos, o Sporting colocou-se novamente a ganhar. Ninguém festejou mais do que Diogo Rosado. Terá sentido, certamente, um grande alívio por ter estado ligado ao golo do empate do Benfica, mas não acredito que não tivesse sentido também que, com a vitória, já não seria injustamente acusado das coisas que o acusavam. No fim do jogo, ficou alguns minutos ajoelhado no terreno. No fim de contas, salvara-se da humilhação a que a estultícia do povo, que só vê o que é fácil de ver, o submetera. Fica, contudo, a nota: o adepto comum vai ao estádio para poder fazer o que não faz na rua, para poder insinuar que todos os que não torcem pela sua equipa são filhos de mulheres da vida, para poder ofender aqueles que têm o poder durante aqueles 90 minutos, e pretende, portanto, que a sua equipa mostre, não arte, não ciência, não organização, não boas ideias, mas sangue, suor e lágrimas. Pretende, pois, dos seus jogadores, não ideias, mas empenho. Se uma equipa de futebol fosse uma empresa de construção civil e o adepto comum um empreiteiro, os trabalhadores não construiriam segundo um projecto, mas trabalhariam incessantemente, colocando tijolos em tudo o que era sítio. Não haveria casa, mas ninguém os poderia acusar de não terem trabalhado. Enquanto adepto, o adepto comum, como este empreiteiro, é um incompetente. E, sinceramente, o futebol já merecia adeptos competentes...